Intercity leva futebol a bolsa de valores espanhola

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Miguel Ángel Moreno.

O presidente do Intercity, Salvador Martí. EFE/Emilio Naranjo

Madri, 29 out (EFE).- O futebol espanhol chegou à bolsa de valores pela primeira vez com o início da negociação de ações do Intercity de San Juan, um clube da quarta divisão (Segunda RFEF), no BME Growth, um mercado para empresas em crescimento, no qual estreou nesta sexta-feira cotado a 1,20 euro por título e avaliado no total em 5,56 milhões de euros.

Fundado em 2017, o clube, que conseguiu três promoções em quatro temporadas e tem como objetivo continuar a crescer até chegar ao futebol profissional, também é pioneiro na entrada no mercado acionário, algo inédito no futebol espanhol.

“Nos sentimos como jogadores que vão disputar um playoff de acesso”, afirmou o presidente do Intercity, Salvador Martí, nos momentos que antecederam o toque do sino na Bolsa de Valores de Madri.

Ele descreveu a operação como “um passo acima na transparência” e “um novo caminho para os acionistas e torcedores de futebol”.

Sediado na cidade de Alicante, o Intercity permite a qualquer investidor participar de seu capital a partir desta sexta-feira.

“O clube foi criado com o objetivo de crescer sem dívidas. Acreditamos que o capital é muito mais barato que a dívida e gera menos risco”, disse Martí, que conta entre seus assessores com Juanfran, ex-jogador de São Paulo e Atlético de Madrid.

O próximo desafio é conseguir nesta temporada a promoção para a Primeira RFEF (terceira divisão), último passo antes de chegar ao futebol exclusivamente profissional na Espanha (contado a partir da segunda divisão), e o clube não descarta investir em infraestrutura.

“Dependendo do financiamento que obtivermos no mercado de ações, queremos construir um estádio e um centro de treinamentos”, explicou Martí.

NOVA ‘CONTRATAÇÃO’ DO BME GROWTH.

Desde esta sexta-feira, o Intercity está listado no BME Growth, antes conhecido como Mercado Alternativo da Bolsa (MAB). Ele é voltado para ajudar as pequenas e médias empresas, para as quais o mercado contínuo está muito distante, a dar o salto para os mercados.

“Destina-se a empresas com um nível de faturamento mais baixo, onde as exigências e o custo são muito mais acessíveis. Ele tenta motivar as empresas a dar aquele salto que lhes permite obter um tamanho maior e gerar mais empregos e crescimento”, explicou Joaquín Robles, analista da empresa de mercados XTB, à Agência Efe.

A atratividade desse mercado é que ele permite às empresas obter “financiamento e liquidez” de forma mais simples, ao mesmo tempo em que dá visibilidade a seus negócios, embora também exija um esforço de transparência, menos do que as empresas listadas no mercado contínuo.

“Para uma pequena empresa, ele oferece liquidez, os investidores podem comprar diretamente no mercado sem ter que procurar por compradores de fora. Também dá visibilidade, porque muitas pessoas podem ver suas contas, conhecer seus negócios e investir sem negociar unilateralmente. E, ao mesmo tempo, dá avaliação: a empresa é avaliada em todos os momentos”, afirmou Robles.

CASOS DE CLUBES DE FUTEBOL NA BOLSA SÃO COMUNS NO FUTEBOL EUROPEU.

O Intercity abre uma via inexplorada na Espanha, mas que é comum em outras grandes ligas europeias, como a Premier League inglesa, a Bundesliga alemã, a Ligue 1 francesa, a Serie A italiana e a Liga portuguesa. Clubes como Manchester United (Inglaterra), Borussia Dortmund (Alemanha), Juventus (Itália), Lyon (França), Benfica (Portugal) e Ajax (Holanda) estão todos em bolsas de valores.

“A Espanha era uma anomalia. Dos países das cinco grandes ligas nacionais, era o único que não tinha um clube cotado (em bolsa). Agora temos um, mesmo que não seja no futebol de elite. E a Espanha é um país mais do que interessante, devido ao excelente controle financeiro que LaLiga tem feito”, disse Luis García, gerente de investimentos da Mapfre AM, à Agência Efe.

García não fala de boatos. Ele administra um fundo, o Mapfre Behavioral Fund, que tem posições em Borussia Dortmund, Ajax e Lyon, então conhece em primeira mão a atratividade desses clubes para os investidores e o impacto que estar listado tem sobre as equipes.

“A gestão esportiva não precisa fazer diferença, além do fato de que abre caminhos criativos de remuneração. O Lyon, durante a pandemia, compensou a redução salarial com ações para as equipes masculina e feminina”, lembrou García.

O fato de um clube ter todas as suas ações na bolsa de valores não significa necessariamente que a administração seja deixada a quem comprar as ações, pois o grupo empresarial ou fundação que controla a administração do clube pode manter uma participação majoritária a fim de não perder o comando.

“No caso da Ajax, sua fundação detém mais de 70% das ações”, ressaltou.

DÚVIDAS SOBRE O EFEITO DE ‘CALL’.

A oferta inicial de ações do Intercity levanta a questão de saber se outras agremiações espanholas seguirão o exemplo. O presidente do clube mostrou-se convencido.

“Não acho, tenho certeza de que é uma questão que levará cada vez menos tempo. Os sócios e acionistas querem cada vez mais transparência, e esta é uma maneira de financiar todos os clubes de futebol”, defendeu Martí.

No entanto, especialistas consultados pela Efe consideram que se trata de um tema complicado.

“O futebol tem estruturas acionárias complexas e é um negócio no qual é difícil ser lucrativo”, afirmou o analista da XTB Joaquín Robles, que acredita ser improvável que haja um efeito de ‘call’.

O caso do Intercity, para ele, tem a particularidade de ser um clube recém-criado, por isso é “muito mais saudável” e “tornou muito mais fácil seu acesso” ao mercado.

Além desta circunstância, 38 dos 42 clubes profissionais vinculados à LaLiga acabam de receber financiamento através do acordo entre a associação patronal e o fundo de investimento CVC Capital Partners, que fornecerá 2,1 bilhões de euros em troca de 9% dos direitos audiovisuais da competição por 50 anos.

“Aderir à bolsa para ter acesso a mais investidores poderia ser interessante para mais clubes, mas estamos em um momento em que as necessidades de financiamento já podem ter sido cobertas, e também de uma forma muito vantajosa, por 50 anos e com uma taxa de juros zero. Poderia animar alguns, mas é uma época em que os clubes de futebol profissional estão financiados”, declarou Luis Garcia, gerente de investidores da Mapfre AM. EFE

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