É possível que listas tenham amantes na mesma proporção que têm odiadores. Após lançadas, provocam a mesma reação para qualquer um deles: uma curiosidade avassaladora. Afinal, é preciso conferir o que é que a lista tem e mais importante, o que a lista deixou passar. Porque naturalmente deixou alguém de fora que na opinião de outro alguém não devia ter sido preterido. Listas têm dessas coisas, assim, injustas.
Injustas para alguns… justas para outras, talvez? Na lista dos 25 melhores livros do século XXI organizada pela Folha e publicada no seu caderno ilustre, consta Como se estivéssemos em palimpsesto de putas (2016) da Elvira Vigna entre os eleitos. Um reconhecimento bastante interessante.
Classifico assim porque, apesar dos vários prêmios que recebeu, a obra da Elvira não parecia gozar de muita popularidade, não parecia ser colocada em local de destaque. Havia elogios, apontavam-se seus méritos, mas faltava alguma coisa, esse reconhecimento aí.
E Como se estivéssemos em palimpsesto de putas, ou simplesmente Putas como a autora o chamava, vale o título. No romance, a narradora acompanha a história de um casal, como se montasse um quebra-cabeças a partir do que lhe é ou não contado, enquanto vive seus próprios problemas.
Por essas coisas da vida, a narradora que foi até João oferecendo seus desenhos acaba ficando para ouvir suas histórias. Histórias de putas. Infindáveis histórias das inúmeras relações curtas com mulheres sobre as quais seu interlocutor não fazia questão de guardar informações e não porque eram muitas, mas porquê não importavam. Como um palimpsesto, um pergaminho que se pode apagar para escrever de novo e de novo, João se repetia amontoando mulheres que não tinham importância e, por isso mesmo, na maioria esmagadora das vezes, sequer tinha nome para ele. A exceção sendo Lola, sua esposa, mas não por si só e, sim, por seu papel na vida de João.
A história contada por Elvira Vigna transita por elementos já conhecidos da sua bibliografia. Além das complicadas relações amorosas, há o crime que importa/não importa inserido na sorrelfa e o contexto histórico que se revela discreta e irreversivelmente: o agora é o pós-ditadura, não dá pra esquecer.
Feliz da Folha que pode fazer esse reconhecimento póstumo para Elvira, uma antiga colaboradora. Que venha a lista dos 50 livros, quando estivermos na metade do século, com sorte, ainda vivendo numa democracia.