Estou sendo intimidado e ameaçado por agentes de inteligência ucranianos que atuam no Brasil, que sabem onde moro e que me disseram que a minha “situação é muito sério [sic.]”.
Na quarta-feira (12) às 08:10 uma pessoa se identificando apenas como Nádia me enviou mensagem no WhatsApp com perguntas sobre um livro-reportagem que escrevi sobre a guerra na Ucrânia (“O povo esquecido: uma história de genocídio e resistência no Donbass”).
“Eduardo, bom dia! Sou Nádia, queria ligar pra você e fazer perguntas sobre seu livro ‘O povo esquecido’. O que horas você está disponível?”, foi sua primeira mensagem. Pelo nome e erros de português percebi que deveria ser russa ou ucraniana.
Nádia disse que trabalha para uma fundação que faz pesquisas sobre “influência destrutiva e opinião pública no Brasil e na América do Sul, incluindo influência dos Estados Unidos, Europeia, Rússia e China, interferência nos eleições e propaganda, fermas dos bots na América do Sul etc”. Também disse que a fundação faz investigações internacionais sobre desinformação, lavagem de dinheiro e outros assuntos. “Vi sua biografia e seria interessante conhecer você”, completou.
E continuou com perguntas muito estranhas: “Quantos livros tem total impressado?”, “quanto tempo você escreveu esse livro?”, “tinha redator?”
Indaguei como ela acessou o livro e disse que eu conheço um tal Vitório Sorotuik, “advogado e representante descendente de ucranianos no Paraná”. Nunca ouvi falar desse senhor. Então Nádia queria saber “sobre financiamento e sobre seu cooperação” com veículos russos e o consulado da Rússia. “Os brasileiros dissem que não tem jornalista assim”, escreveu ainda. Ela também afirmou que “no livro não tem dados básicos”.
Mas que “dados básicos”? No próprio livro está escrito que a minha ida como enviado especial à Rússia e ao Donbass em 2022 foi um projeto da imprensa do Partido da Causa Operária, financiado pelos militantes e simpatizantes do Partido. Ao longo de todo o livro menciono o Partido, bem como o companheiro Rafael Dantas, que também foi destacado pelo PCO para cobrir o conflito em dupla. Nós documentamos, tanto nas redes sociais próprias, como na imprensa escrita e no canal da Causa Operária TV, alguns dos crimes dos grupos nazistas da Ucrânia no Donbass. Isso também foi documentado no livro.
Imagino que Nádia tenha monitorado um evento realizado pela Associação José Martí de Santos em comemoração dos três anos da operação russa, e que contou com a presença de um representante do consulado russo convidado pela associação. Por graves questões de saúde (já melhorei), me afastei do PCO e o livro acabou não sendo publicado no Brasil. Há uma edição portuguesa com direitos Creative Commons. Posteriormente, imprimi 100 exemplares por conta própria para distribuição naturalmente limitada. Alguns deles entreguei ao representante do consulado russo. Os diplomatas russos sabem que o PCO foi a organização brasileira que apoiou de forma mais contundente, enfática e incondicional a operação militar especial da Rússia no Donbass, inclusive realizando uma manifestação em frente ao consulado em São Paulo, em março de 2022 – quando elementos pró-Ucrânia espancaram um jovem que estava indo para o ato. Nós, militantes revolucionários e internacionalistas, não escondemos o nosso lado: o lado da Rússia contra a OTAN e o imperialismo, assim como o lado de Cuba, da Venezuela, da China e da Palestina. A Ucrânia não passa de uma bucha de canhão da OTAN e Zelensky não passa de uma prostituta que virou cafetão e abre seu bordel para o divertimento dos americanos e europeus – a negociação de terras raras com Trump fala por si. Não temos o menor respeito por uma ditadura surgida de um golpe de Estado financiado e organizado pelos EUA e pela União Europeia, que infestou o aparato de Estado do novo regime com militantes nazistas para banir as organizações de esquerda, suprimir a cultura russa falada por milhões de ucranianos e iniciar uma guerra contra os povos do Donbass, que não aceitaram o golpe fascista.
Nádia estava muito interessada em falar comigo, inclusive por vídeo, e disse que uma tal de Vilma, que ela identificou como jornalista de Curitiba, estaria em São Paulo no mesmo dia e queria falar pessoalmente comigo. Minutos depois, Nadia tentou me ligar. Não atendi e perguntei qual o sobrenome dela e que fundação era aquela que ela citou, mas não me respondeu e algumas horas depois tentou me ligar novamente. Ela sugeriu que entrou em contato comigo a partir de um trabalho envolvendo outras pessoas (“parece que minhas colegas disseram certo, que você não existe [?]”). E continuou insistindo em ligar para mim. No dia seguinte, no mesmo horário, ela voltou a me mandar mensagens, querendo falar comigo.
Finalmente combinamos um horário. O número do telefone sugere que é uma empresa comercial chamada “BIT Show”, enquanto o número de WhatsApp está cadastrado como “Potentec Representação Comercial Ltda.”, supostamente uma “agência de consultoria, advogado empresarial” com número do Rio de Janeiro. O site da empresa não abre. No início da chamada eu disse a ela que iria escrever uma reportagem sobre esse assédio a um jornalista e que a conversa seria gravada. Se ela foi tão invasiva eu também me dou o direito de fazer perguntas. Perguntei seu sobrenome e ela respondeu “Nikolaeva”. Quando questionei como ela conseguiu meu número, ela disse que foi um suposto colega meu que lhe passou, mas indagada sobre que colega era esse, Nádia desligou a chamada.
Além de mim e de Nádia, há um terceiro personagem que participa da trama. Ainda naquela quarta-feira (12), às 11:10, recebi mensagens de um perfil no WhatsApp com a mesma foto que a do perfil de Nádia (um logotipo), mas o número indicava que era do Paraná e o nome cadastrado era Sergio Nefedov. Ele disse que “nossas colegas de SP enviaram esse informacao, você sempre pode communicar comigo. Sou Sérgio, vou ajudar você. Informe seu administracao sobre isso. Situação é muito sério.” Eram dois documentos em PDF sobre a minha MEI, com os dados detalhados da empresa, incluindo o nome da minha mãe e meu endereço. Perguntei quem era ele, onde conseguiu os documentos, que colegas eram essas e o que significava “muito sério”. Não me respondeu.
No dia seguinte, após Nádia recusar continuar a conversa comigo, eu liguei para o telefone de Sérgio e quem atendeu foi uma mulher. Não falou quem era e perguntou quem eu era. Eu disse que era o Eduardo e ela começou a perguntar: “você fala russo?” Eu disse que não. Ela falou: “Mas você trabalhou na Pravda”. Então percebi que era a própria Nádia, questionei qual sua relação com Sérgio e ela desligou. Pouco depois Sérgio finalmente me mandou mensagem, também mencionando a “jornalista” Vilma que queria se encontrar comigo. E me disse: “ninguém conhece você. Assim pode ficar popular. No Paraná mora um milhão de ucranianos”. Liguei novamente para Sergio (ou Serguei?) e um homem com sotaque russo ou ucraniano atendeu, dizendo que estava no Paraná. Perguntei se ele era ucraniano e ele disse que era russo de Moscou. Interpelei qual o nome da fundação (mencionada por Nádia) e ele disse “Union do Sul”, e disse que era brasileira – não consegui encontrar nenhuma organização com esse nome. Então eu perguntei o que os ucranianos tinham a ver com isso e ele disse não entender o que eu falei. Questionei se ele trabalha com Nádia, mas ele desligou e recusou novas ligações.
Em seguida, Sérgio enviou mensagens com fotos do livro e com perguntas semelhantes às de Nadia. “Quantos livros vcs publicarem ja? É seu livro?”, “Não tem informações quando publicado?”. Propôs ainda um encontro no final de semana. Após recusar ligações, tentou realizar uma chamada de vídeo. Enviou nova mensagem: “O que pagava pra voce e quanto, qual CNPJ? Se voce nervoso, voce tem alguma coisa para fechar.” Ainda mencionou a OAB do Paraná e de São Paulo, cujos advogados teriam trabalhado com sua “ONG”. Sérgio ainda disse que “jornalistas vao contatar com voce, so isso”. E, voltando a sugerir (agora abertamente) que sou um propagandista do Kremlin (pausa para um bocejo), escreveu:
“Deixa nos contato do seu sponsor, por gentileza – Pravda, Rossotrudnichestvo ou Rossiya Segodnya, RosatomAL. Voce trabalha pra russos, queria contatar com eles, mas escolha alguem mais inteligente. Talvez eles nao entenderam ultima vez em SP, eles nao conseguiram escrever nada… Fizemos pesquisas de desinformacao ao lado dos Estados Unidos tmb.” Inseriu um link que, obviamente, vindo de um elemento da inteligência ucraniana, famosa por estar por trás de uma série de ataques hackers, eu não abri. Pouco depois, tentei ligar novamente para Sérgio, mas ele não me atendeu.
Meu trabalho jornalístico e minha militância política são públicos. Não escondo nem mesmo nos meus textos que são publicados em uma dezena de veículos brasileiros e estrangeiros (não só o Pravda.Ru, que publica meus artigos há quase 10 anos, mas Rebelión, Global Research, Resumen Latinoamericano, Pressenza, Strategic Culture Foundation etc). Não escondo nem mesmo nos meus comentários na rádio Sputnik ou na Fepal – sim, além de agente russo, também sou agente do terrorismo palestino! Não escondo nem mesmo meu trabalho na Juche TV, canal que criei há muitos anos para divulgar a realidade da Coreia do Norte – é pura propaganda da ditadura totalitária de Kim Jong Un, não assistam! Quem quiser ler os meus artigos a favor do Talibã, de Nicolás Maduro, da bomba atômica do Irã, de que Lula se torne igualmente um ditador publicados no Causa Operária, pode procurar.
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Criminosos são esses agentes de inteligência de um regime nazista, que tentam intimidar um jornalista e militante operário e se escondem atrás de telefones e nomes falsos. A denúncia contra essa perseguição também está sendo feita ao Sindicato dos Jornalistas de São Paulo e outros órgãos, e, espero, será compartilhada por nossos leitores.
Não vou terminar com o bordão “Nazistas não passarão”, porque, no caso dos nazistas ucranianos, é só olhar o modo como eles fogem gritando dos tanques russos e das milícias populares do Donbass para ver como o fascismo realmente é combatido e que eles não passam de répteis covardes. Antes de tentar perseguir jornalistas do país onde operam (como fazem na Ucrânia), deveriam aprender com o esporro que seu chefe tomou recentemente na Casa Branca e se colocar em seu devido lugar.
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A quem se interessou pelo livro, resolvi disponibilizar o pdf a partir de agora.