Código Penal

Artigo: ministra Anielle Franco não foi vítima de assédio sexual

“Mesmo que o assédio sexual hierárquico não tenha ocorrido, o assédio em uma relação horizontal de trabalho — entre pessoas no mesmo nível hierárquico — poderia ser enquadrado como importunação sexual, conforme a Lei nº 13.718/2018. Essa conduta envolve a prática de atos libidinosos contra alguém sem o seu consentimento, o que também configura uma violação grave da integridade da pessoa”

Ministra Anielle Franco participa da cerimônia do pacto pela diversidade, equidade e inclusão nas empresas estatais. Foto: Joédson Alves/Agência Brasil
Ministra Anielle Franco participa da cerimônia do pacto pela diversidade, equidade e inclusão nas empresas estatais. Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

Recentemente, uma discussão tomou forma em torno da ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, sugerindo que ela teria sido vítima de assédio sexual. No entanto, ao analisarmos o caso com base no Código Penal Brasileiro, mais especificamente o Art. 216-A, é importante esclarecer que essa hipótese, no contexto atual, não se configura como tal.

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De acordo com a legislação vigente, o crime de assédio sexual envolve “constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual”, utilizando-se da posição de superior hierárquico ou de ascendência sobre a vítima, inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. No caso da ministra, que ocupa o mesmo nível hierárquico que o ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, não há uma relação de subordinação que permita enquadrar o caso como assédio sexual, conforme o Art. 216-A.

Entretanto, é importante ressaltar que isso não exclui a possibilidade de que subordinadas do ministério possam ter sido vítimas de assédio sexual, caso as investigações confirmem que houve o uso de uma posição superior para obter vantagens sexuais. Se provado, essas funcionárias estariam sim protegidas pelo Art. 216-A do Código Penal, que define assédio sexual com base na subordinação da vítima.


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Além disso, mesmo que o assédio sexual hierárquico não tenha ocorrido, o assédio em uma relação horizontal de trabalho — entre pessoas no mesmo nível hierárquico — poderia ser enquadrado como importunação sexual, conforme a Lei nº 13.718/2018. Essa conduta envolve a prática de atos libidinosos contra alguém sem o seu consentimento, o que também configura uma violação grave da integridade da pessoa.

Assim, embora o caso da ministra Anielle não preencha os requisitos para o crime de assédio sexual, não se pode descartar que outras formas de abuso possam ter ocorrido. Assédio moral, importunação sexual ou qualquer outra forma de constrangimento no ambiente de trabalho são extremamente sérios e merecem ser tratados com total rigor e responsabilidade.

A integridade dos servidores públicos é um pilar essencial para o funcionamento adequado das instituições, e qualquer violação a esses direitos precisa ser investigada com a devida atenção e transparência. Crimes contra a dignidade, seja no âmbito sexual, moral ou de qualquer outra natureza, não podem ser ignorados ou minimizados.

Tal episódio envolvendo ministros serve como um alerta para a importância de promovermos o respeito, a integridade e a responsabilidade em todas as relações de trabalho, sobretudo no serviço público, onde os padrões de conduta devem ser exemplares. Que as investigações continuem com seriedade e imparcialidade, garantindo que toda prática abusiva seja apurada e punida de acordo com a lei.

*Raquel Gallinati é secretária de Segurança Pública de Santos e diretora da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil.

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