O retorno do grande porrete e dos tambores da guerra mundial

11 de abril de 2025
Leia em 4 mins
Cartoon de Louis Dalrymple, em 1905, ilustra a Ideologia do Big Stick. Presidente Theodore Roosevelt carrega um porrete com a inscrição "nova diplomacia". Fonte: HistoryWiz.com
Cartoon de Louis Dalrymple, em 1905, ilustra a Ideologia do Big Stick. Presidente Theodore Roosevelt carrega um porrete com a inscrição "nova diplomacia". Fonte: HistoryWiz.com

O período que vai de 1898 a 1945 contempla o crescimento e a consolidação do imperialismo americano e sua hegemonia global. A intensa e frenética industrialização dos Estados Unidos, assegurada a partir da unificação pós-guerra civil, com a construção das ferrovias, a formação dos monopólios industriais e sua fusão com o capital bancário, revelaram ao mundo aquele grande colosso econômico.

Esse desenvolvimento formidável das forças produtivas gerou a necessidade histórica da expansão imperialista sobre os mercados do mundo todo. Mas foi também uma expansão colonial. A burguesia americana subjugou a europeia começando pela Espanha, um dos primeiros impérios coloniais gerados pelo nascimento das relações capitalistas. A evolução do imperialismo americano se completou com a sujeição do império japonês, um dos últimos a alcançar o pleno desenvolvimento capitalista.

Como se sabe, os acontecimentos desse período foram sintomas e consequências das duas guerras mundiais. Dois dos personagens chave dessa conquista do imperialismo americano foram os parentes Theodore e Franklin D. Roosevelt. Com suas idiossincrasias, representaram o mesmo fenômeno: a obrigação imperiosa de expansão e domínio do capital americano sobre o mundo inteiro. Nesse sentido, apesar da demagogia da boa vizinhança, Franklin terminou por copiar a prática do grande porrete de Theodore.

Agora esse domínio está no ponto mais baixo. A tendência não é ser retomado, e sim superado. Mas os Estados Unidos não podem aceitar seu próprio declínio de braços cruzados. Diante da crise histórica em que o capitalismo mundial, sob a sua liderança, se encontra, é preciso retomar a velha política do grande porrete.

E essa política, ao contrário do que alguns podem pensar, não leva consigo nenhuma contradição com o protecionismo econômico. O livre-comércio é a exploração das outras nações sob a fachada da boa vizinhança ou da coexistência pacífica, embora ele também seja adepto da força bruta, quando necessário. O protecionismo, ao anular o livre-comércio, não elimina a necessidade daquela exploração. Afinal de contas, nem mesmo um país populoso e com vastos recursos naturais como os Estados Unidos tem condições de caminhar integralmente sobre suas próprias pernas. Principalmente se as forças produtivas desse país são tão desenvolvidas que as fronteiras do Estado-nação já não as comportam mais.

Assim, as tarifas de Donald Trump são acompanhadas das ameaças militares a outros países. Os panamenhos tiveram de cancelar a parceria com a Nova Rota da Seda e dois terminais portuários chineses podem ter de passar para outras mãos, ao mesmo tempo em que os navios de guerra norte-americanos terão passagem liberada. Tudo isso, depois de Trump ameaçar tomar novamente o canal do Panamá, inclusive à força.

O drama da Groenlândia também corre perigo de ter um desfecho violento. A possessão dinamarquesa guarda recursos minerais necessários para tornar a América grande novamente, além de estar localizada estrategicamente do ponto de vista militar e comercial, na ponta ocidental da nova rota do Ártico.

Nem mesmo medidas aparentemente inocentes devem ser desprezadas. Trump não renomeou o Golfo do México por romantismo nacionalista. As áreas pertencentes ao México e a Cuba contêm reservas inexploradas de petróleo e gás natural preciosíssimas para o boom econômico que o republicano quer incentivar em seu país. Considerar aquelas águas como propriedade dos Estados Unidos seria um passo em direção à concretização dos objetivos anunciados há poucos meses por Trump: perfurar, perfurar, perfurar!

A ExxonMobil praticamente já colonizou a Guiana. Controla sua economia e sua política interna e externa. Marco Rubio deixou claro, com todas as letras, em visita recente, que os Estados Unidos vão intervir militarmente para proteger a exploração de petróleo da companhia estadunidense, caso ela seja ameaçada – em especial, pela Venezuela. Uma hipotética intervenção militar direta dos EUA não asseguraria apenas o petróleo guianense, mas também levaria à desestabilização e possível queda do governo venezuelano, dono das maiores reservas de petróleo do mundo. É claro, tal intervenção também significaria um perigo elavadíssimo para o Brasil e toda a América do Sul e Latina – que o Pentágono deseja publicamente afastar da China, e nenhuma solução pode ser descartada.

Desde que invadiram e tomaram conta de uma parcela do território da Síria, os Estados Unidos literalmente roubam petróleo daquele país. É difícil encontrar um caso semelhante em qualquer momento da história recente. E as atividades, de modo geral, estão a todo o vapor e sem nenhum inconveniente. Nem a guerra fratricida, nem o Eixo da Resistência conseguiram impedir esse assalto em plena luz do dia. Agora, algo parecido poderá ocorrer na Ucrânia, mas, ao contrário da Síria, que não deu permissão aos EUA, Vladimir Zelensky já tem a proposta em suas mãos para entregar minerais e terras raras como compensação retroativa pela ajuda militar.

Os Estados Unidos estão buscando retomar uma política industrial como saída para a crise, que não para desde 2008. O caminho indicado pela Europa tende a ser seguido pelos americanos: a industrialização baseada no rearmamento. A relativa desvantagem dos EUA com relação à China não é apenas econômica, e com relação à Rússia não é apenas de influência nos países pobres. Em muitos aspectos, a indústria bélica norte-americana está defasada. Para alcançar seu objetivo de industrialização, Trump terá que apostar na indústria da guerra. E a indústria da guerra, como toda indústria, busca o lucro. Logo, os interesses dos diferentes e poderosos ramos econômicos dos EUA – como da Europa – tendem a coincidir que, no frigir dos ovos, a grande solução para seus problemas atuais e históricos não será nada senão a guerra mundial para a preservação de seu sistema, como em 1914 e em 1939.

Eduardo Vasco

Eduardo Vasco é jornalista especializado em política internacional, correspondente de guerra e autor dos livros O povo esquecido: genocídio e resistência no Donbass e Bloqueio: a guerra silenciosa contra Cuba

Authors

Newsletter

Most viewed

– Publicidade –

Don't Miss

Pôster de The Last of Us - Divulgação/Max

The last of us: aquele pós-apocalipse que a gente gosta

Às vésperas da estreia da segunda
Gilvan da Federal e Bolsonaro

Protejam Lula

Polarização ideológica acentua tensão entre democracia