Presidente eleito do Paraguai minimiza interesse em cobrar mais caro pela energia de Itaipu

O presidente eleito do Paraguai, Santiago Peña, disse que receber mais recursos do Brasil pela energia produzida em Itaipu não é um ponto crucial da relação entre os dois países. O mais importante, segundo ele, é usar a energia produzida na usina hidrelétrica binacional para gerar empregos e fomentar o desenvolvimento social, no Paraguai e nos demais países da região.

Peña está em Brasília, onde se encontrou com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em sua primeira viagem depois de eleito. Questionado sobre o Tratado de Itaipu, que completou 50 anos em abril último e portanto pode ser revisado — em particular o anexo C, que define os preços cobrados pela energia vendida —, o paraguaio respondeu que o objetivo de qualquer acordo revisionista deve estar focado sobretudo na integração regional e na melhoria da qualidade de vida.

“Nossa conversa não pode estar baseada apenas em investimento, em dinheiro. Precisamos de um processo de integração que permita que, dentro de 50 anos, vejam que nós ousamos sonhar com o desenvolvimento dos nossos povos”, afirmou. Ele disse que seu mandato pretende gerar 500 mil empregos em 5 anos e que essa meta deve ser buscada “não com uma política rentista, vendendo energia, mas utilizando energia”.

O anexo C deve ser revisado, pois isso está previsto no tratado, afirmou o presidente. “Mas nada impede que possamos discutir todo o tratado, além das condições financeiras”.

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Segundo artigo publicado recentemente no jornal Valor Econômico, há muita desinformação a respeito do que se pode ou não fazer com a energia de Itaipu. O tratado binacional prevê, em seu artigo XIII, que os países-donos do empreendimento estão comprometidos a adquirir o total da potência instalada. Isso está no texto principal, não no Anexo C, e seria preciso a aprovação do Congresso Nacional para alterá-lo.

Relações com a Venezuela

Questionado também sobre a retomada de relações diplomáticas com a Venezuela, anunciada antes das eleições, Peña disse que o Paraguai sempre teve uma relação com o povo da Venezuela e isso nunca impediu o país de ter uma visão crítica sobre o que chamou de “desrespeito aos direitos humanos e à realização de eleições”. O presidente reiterou que as relações serão retomadas sem que qualquer condição seja imposta.

Vocação “integradora”

Questionado ainda sobre o encontro de chefes de Estado que o presidente Lula pretende realizar em Brasília no dia 30 de maio, para estreitar laços com os países sul-americanos, Peña afirmou que vai apoiar o processo de integração regional em todos os âmbitos. “Tenho uma vocação integradora. Todos os países têm que ser respeitosos com as visões dos líderes que são eleitos, sem ideologizar as relações diplomáticas”.

Tratado de Itaipu, 50 anos

Há 50 anos, em abril de 1973, Brasil e Paraguai assinaram o Tratado de Itaipu, uma sociedade binacional que determinava como seria o aproveitamento hidrelétrico do Rio Paraná por meio da futura Usina Hidrelétrica de Itaipu, que seria construída entre 1975 e 1982. Conforme previsto pelo chamado anexo C, neste ano expira uma obrigação imposta aos paraguaios: a venda do excedente energético a preço de custo ao Brasil.

De acordo com o tratado, cada país tem direito a 50% da energia gerada, de acordo com sua capacidade instalada. O Brasil, além de sua parcela, adquire cerca de 30% da energia que pertence ao Paraguai a preço de custo, ou seja, pelo valor da tarifa (atualmente em US$ 16,71 por kW, cerca de R$ 82).

Do lado paraguaio, existe uma pressão para que a energia seja vendida a preço de mercado, seja para o Brasil, seja outro comprador. Do lado brasileiro, existe uma expectativa de reduções tarifárias para os consumidores das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, cujas distribuidoras adquirem, por lei, a energia de Itaipu.

Com 20 unidades geradoras e 14 GW de potência instalada, a usina de Itaipu é uma das maiores hidrelétricas do mundo. Ela fornece cerca de 8,5% da energia consumida no Brasil e supre quase 90% do consumo paraguaio. Além disso, gera royalties divididos igualmente entre os dois países, que somaram mais de US$ 25 bilhões desde que entrou em operação.

Relação bilateral

Na América Latina, o Paraguai abriga a maior comunidade brasileira residente no exterior, superior a 245 mil pessoas. O Brasil é o principal parceiro comercial do Paraguai e é a maior origem de investimentos estrangeiros diretos no país vizinho (US$ 904 milhões). Em 2022, a corrente comercial entre os dois países alcançou valor recorde de US$ 7,15 bilhões (cerca de R$ 35 bilhões)  – um incremento de 7,8% em relação ao ano anterior.

*Com informações do Ministério de Relações Exteriores, do jornal Valor Econômico e da agência Deutsche Welle 

Edição: Patrícia de Matos