10,5% das vítimas de estupro de vulnerável são crianças na faixa de 0 a 4 anos

10,5% das vítimas de estupro de vulnerável são crianças na faixa de 0 a 4 anos

A violência contra a criança é um problema recorrente no Brasil. Dados do Disque 100 indicam que maus-tratos (15.127 casos), insubsistência afetiva (13.980 casos), exposição ao risco de saúde (12.636 casos) e tortura psíquica (11.651 13.980 casos) foram os principais tipos de violência contra a criança registrados no primeiro semestre de 2022.
 

O Anuário Brasileiro de Segurança, por sua vez, alerta para outro grave problema: a violência sexual. No Brasil, cerca de 61,3% do total de estupros são de vulneráveis (0 a 13 anos). Desses, 19,1% das vítimas estão concentradas na faixa etária de 5 a 9 anos e 10,5% na faixa de 0 a 4 anos.
 

Na semana do Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, o Núcleo Ciência pela Infância (NCPI) alerta para a importância de estratégias de prevenção da violência contra crianças.

“A violência é uma grave violação de direitos humanos que não pode ser ignorada. Ela destrói recursos e potencial humano. Para enfrentá-la, deve-se contar com uma estratégia de atuação integrada, intersetorial e centrada na criança. É preciso quebrar o ciclo intergeracional da violência, em que crianças que sofreram violência na infância tendem a repeti-la com seus filhos e filhas”, comenta Maria Beatriz Linhares, Professora Associada Sênior do Departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP
 

A pesquisadora é a responsável peloworking paper “Prevenção da Violência Contra a Criança”, lançado em março deste ano, pelo NCPI.O material apresenta estatísticas sobre a violência contra a criança, informações sobre o impacto desse problema e propõe medidas de enfrentamento dessas práticas.
 

Medidas de prevenção
 

Linhares defende a implementação de programas de intervenção centrados na parentalidade para minimizar a ocorrência da violência contra as crianças. Segundo ela, esses programas têm se provado efetivos tanto para promover o desenvolvimento das crianças nos primeiros anos de idade em países de baixa, média e de alta renda quanto para quebrar o ciclo intergeracional da violência.
 

“Essas intervenções ajudam a prevenir a violência contra crianças na medida em que aumentam a compreensão dos pais ou outros cuidadores sobre o desenvolvimento infantil, diminuem o estresse parental e melhoram as práticas parentais com estratégias de disciplina positiva não violenta”, comenta.
 

No Brasil, um dos exemplos de programas de parentalidade é ACT — Para Educar Crianças em Ambientes Seguros. Implementado no Ceará. Os rsultados das pesquisas com o ACT demonstraram que, após a participação no programa, os cuidadores melhoraram as suas práticas de parentalidade positiva como a comunicação, regulação emocional e comportamental e de disciplina positiva e as crianças apresentaram menos problemas de comportamento.
 

Garantir a equidade de oportunidades para reduzir ou eliminar desigualdades; fortalecer políticas públicas intersetoriais já existentes; buscar soluções com urgência para o problema da violência contra crianças; prevenir novos casos e manter um sistema de dados atualizado de notificação de casos de violência contra crianças nos âmbitos federal, estadual e municipal, separando por faixa etária, são outros exemplos de medidas que podem ser aplicadas.
 

Impactos da violência nas crianças
 

Segundo Maria Beatriz Linhares, a violência na infância tem consequências que podem perdurar a vida toda, da infância à adolescência, com graves impactos pessoais e para a sociedade.

“Crianças expostas à violência estão submetidas a situações de estresse tóxico. Isso provoca alterações fisiológicas e psicológicas que podem interferir no funcionamento do sistema nervoso central em áreas relacionadas à memória, ao aprendizado, às emoções e ao sistema imunológico. Tais alterações podem trazer prejuízos que persistem até a vida adulta, contribuindo, inclusive, para o surgimento de doenças crônicas”, explica Maria Beatriz Linhares.
 

Além disso, a situação pode gerar agressividade, problemas de atenção, hipervigilância, ansiedade, depressão, problemas de adaptação e desemprenho escolar e problemas psiquiátricos como fobia e estresse pós-traumático. “A violência representa um fator de caos no desenvolvimento infantil na medida em que provoca uma grande instabilidade estrutural e funcional permeada por conflitos e brigas, entre outras adversidades”, finaliza.
 

Dados para apoiar a pauta:

  • Dados do Disque 100 indicam que, apenas no primeiro semestre de 2022, foram registradas 122.823 violações contra crianças na faixa etária da primeira infância. Na maioria dos casos, os agressores eram conhecidos das crianças: cerca de 84% delas eram cometidas por familiares (mãe, pai, madrasta/padrasto ou avós).
  • De acordo com o Disque 100, Maus-tratos (15.127 casos), Insubsistência afetiva (13.980 casos), Exposição ao risco de saúde (12.636 casos) e tortura psíquica (11.651) foram os principais tipos de violência registrados no primeiro semestre de 2022.
  • Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança, houve aumento nas taxas em todos os crimes registrados, sobretudo abandono de incapaz e maus-tratos. De 2020 a 2021 as taxas de abandono de crianças e adolescentes de 0 a 17 anos aumentaram de 13,4% para 14,9%. Já os índices de maus tratos subiram de 29,8% para 36,1%.
  • 62% das crianças e adolescentes vítimas de maus-tratos têm entre 0 e 9 anos e 26% possuem entre 0 e 4 anos. Quando as vítimas possuem entre 0 e 4 anos, 68,4% dos crimes de maus-tratos são causados por pessoas do sexo feminino.

Por que falar sobre o assunto?

  • Atentar para a necessidade de políticas públicas que protejam crianças, principalmente as mais vulneráveis
  • Mostrar criar um ambiente propício para o desenvolvimento das crianças e auxiliar os pais a lidarem com os pequenos nesse momento

Fontes sugeridas:

  • Maria Beatriz Linhares, Professora Associada sênior do Departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP), coordenadora do Laboratório de Pesquisa em Prevenção de Problemas de Desenvolvimento e Comportamento da Criança (LAPREDES), Pesquisadora Sênior do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Pesquisadora do Centro de Pesquisa Aplicada à Primeira Infância (CPAPI-FAPESP) e Mebro do Comitê Científico do Núcleo Ciência Pela Infância (NCPI).

Sobre o Núcleo Ciência Pela Infância (NCPI)

Criado em 2011, o NCPI é uma coalizão que tem por objetivo produzir e disseminar conhecimento científico sobre o desenvolvimento da Primeira Infância para promover e qualificar programas e políticas públicas para crianças brasileiras em situação de vulnerabilidade social. O NCPI é composto, atualmente, por sete organizações: Center on the Developing Child da Universidade de Harvard, David Rockefeller Center for Latin American Studies, Faculdade de Medicina da USP, Fundação Bernard van Leer, Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, Insper e Porticus América Latina