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Foi revogada a resolução das secretarias de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese) e de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) de Minas Gerais, que regulamentava a consulta prévia aos povos e comunidades tradicionais de Minas Gerais impactadas por grandes empreendimentos. A revogação foi publicada no Diário Oficial na última quarta (31).

A norma vigorou por pouco mais de um ano e, durante esse período, foi uma das principais preocupações das populações tradicionais mineiras. Isso porque a norma somente conferia o direito de serem consultados os povos e comunidades certificados oficialmente, contrariando o princípio da autodeterminação.

O prazo de 45 dias para a realização da consulta e a possibilidade do próprio empreendedor realizá-la, pontos previstos na resolução, também foram duramente criticados pelos povos e comunidades.

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A consulta livre e informada é prevista na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário, e é um instrumento de proteção das comunidades contra a mineração, o agronegócio, as barragens, grandes obras e outros empreendimentos de forte impacto.

Pressão histórica

A revogação aconteceu dias depois de um grande encontro de mais de 100 lideranças de Minas Gerais, entre 19 a 21 de maio, em Ribeirão das Neves (MG). O evento lançou uma carta política com 14 reivindicações, com destaque para a revogação imediata da resolução.

O documento foi assinado por 45 povos e comunidades do estado, entre eles povos indígenas, quilombolas, vazanteiros, pescadores, vacarianos, geraizeiros, ciganos, carroceiros, congadeiros, reinadeiros, povos de terreiros, apanhadoras de flores, veredeiros, chapadeiros e faiscadores tradicionais, além de dezenas de movimentos populares e parlamentares apoiadores.

“Denunciamos que o estado de Minas Gerais viola sistematicamente os direitos dos povos e das comunidades tradicionais. Sob o manto de um falso projeto de desenvolvimento, empreendimentos minerários do grande capital têm devastado comunidades inteiras, contaminado as águas e exposto as pessoas a problemas graves de saúde”, lamentam.

A carta requer também a posse e condições de funcionamento para a Comissão Estadual de Povos e Comunidades Tradicionais (CEPCT), e que através dela o governo mineiro cumpra a lei estadual 21.147/14, que determina a Política Estadual dos Povos e Comunidades Tradicionais de Minas Gerais, em especial a retomada da emissão de certidões de autorreconhecimento às comunidades.

Carta

Leia as 14 exigências do Encontro de Povos e Comunidades Tradicionais de Minas Gerais:

1 – O nosso direito à Consulta e ao Consentimento Prévios, Livres, Informados, e de Boa-fé sejam efetivados, e os nossos Protocolos de Consulta sejam respeitados. Temos o direito de dizer não;

2 – A Resolução Conjunta n° 01/2022 da SEDESE/SEMAD seja imediatamente revogada;

3 – A Comissão Estadual de Povos e Comunidades Tradicionais (CEPCT) seja empossada e tenha orçamento próprio e condições de funcionamento, para que tenhamos no estado de Minas Gerais um espaço de defesa dos nossos direitos;

4 – O Programa de Proteção de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos do estado de Minas Gerais seja fortalecido, para que ele de fato cumpra seu papel de proteger lideranças ameaçadas e comunidades em situação de risco e vulnerabilidade;

5 – O governo do estado através da CEPCT, cumpra com a Lei estadual n° 21.147/14 que instituiu a Política Estadual dos Povos e Comunidades Tradicionais de Minas Gerais, em sua integralidade, especialmente, para que seja retomada a emissão de certidões de autorreconhecimento às comunidades, promova o mapeamento desses Povos e regularize, com celeridade, os seus territórios tradicionais. Ressaltamos, ainda, que o Governo de Minas Gerais deve respeitar a autodeterminação dos Povos e Comunidades Tradicionais, independente de emissão de certidão;

6 – O Supremo Tribunal Federal reconheça o direito originário dos povos indígenas aos seus territórios, independentemente de qualquer marco temporal;

7 – As comunidades atingidas pelos brutais crimes socioambientais ocorridos no estado de Minas Gerais tenham garantida a reparação integral dos danos sofridos;

8 – A imediata suspensão de todos os licenciamentos ambientais que atingem Povos e Comunidades Tradicionais até que nossos direitos, incluindo o direito territorial e à Consulta e Consentimento Prévios, Livres, Informados e de Boa-fé, sejam efetivados;

9 – A investigação séria das relações entre o Ministério Público de Minas Gerais com grandes empresas, sobretudo mineradoras, que dificultam nossas (r)existências, com punição adequada a quem delas indevidamente se beneficia;

10 – As Secretarias Municipais de Assistência Social estruturem equipes volantes para fazer uma busca ativa, viabilizando o Cadastro Único dos Povos e das Comunidades Tradicionais para possibilitar a identificação da diversidade social brasileira, dando suporte ao reconhecimento de grupos populacionais em respeito aos seus modos de vida, e possibilitar o acesso adequado às políticas públicas;

11 – O acesso à informação e à formação referente a leis de fomento à cultura e patrimônio para acesso dos Povos e Comunidades Tradicionais;

12 – O respeito à Comunidade Tradicional Carroceira de Belo Horizonte e da Região Metropolitana de Belo Horizonte, cujos direitos têm sido violados por meio de proposição de leis. Assim como todos os Povos e Comunidades Tradicionais, carroceiros e carroceiras, têm em seus animais companheiros de vida e trabalho. O racismo ambiental, que na falsa ideia de separação entre humanos e natureza, nega os direitos à vida e ao território, viola não apenas a Convenção 169 da OIT, mas a nossa tradicionalidade dessas comunidades;

13 – O governo Lula reconheça por meio de decreto a Emergência Climática em nosso país, conforme reivindicação apresentada pelos Povos Indígenas no Acampamento Terra Livre (ATL);

14 – O respeito aos Povos e Comunidades Tradicionais do Vale do Jequitinhonha e do Vale do Rio Pardo, fortemente afetados pelas investidas do governo Zema com projetos como o “Projeto Vale do Lítio”, que envolve a venda de nossos territórios, reduzindo-os a “riquezas minerais”, para o capital estrangeiro. Não somos Vale do Lítio, somos Vale do Jequitinhonha!

Fonte: BdF Minas Gerais

Edição: Larissa Costa

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