Meio ambiente: Criar cultura de coleta seletiva é a melhor forma para destinação correta do lixo, diz especialista

O meio ambiente tem sido pauta de intensos debates nos últimos anos, devido à necessidade de se preservar o planeta para a atual e as futuras gerações. Na tentativa de ampliar o leque de ações em defesa do meio ambiente, diversas iniciativas foram apresentadas ao longo dos anos. Dentre elas, está a Política Nacional de Resíduos Sólidos, instituída pela lei 12.305/2010, a principal política pública que orienta o melhor aproveitamento dos recursos naturais, o combate ao desperdício e a redução da poluição ambiental, segundo o Ministério do Meio Ambiente (MMA). 

Conforme a pasta, a política traz objetivos, instrumentos e  diretrizes para se aproveitar ao máximo esses materiais, preservando os recursos naturais. Para o doutor em Desenvolvimento Sustentável, especialista em Gestão Ambiental e professor da Faculdade de Tecnologia da Universidade de Brasília, Paulo Reis, a lei deu um direcionamento para a resolução de questões relacionadas aos resíduos sólidos. 

“No âmbito da lei, você consegue ver ali questões ligadas a como fazer gestão integrada de resíduos sólidos, como ter a responsabilidade compartilhada do gerador, do produtor do fabricante do material que acaba se tornando resíduo. Como implementar mecanismos de logística reversa, responsabilizando, dessa forma também, o fabricante pelo resíduo que é gerado por seu produto”, explica o professor.

Segundo o Ministério do Meio Ambiente, o Poder Executivo Federal investiu mais de R$ 200 milhões nos municípios nos últimos quatro anos, com o objetivo de garantir mais capacitação, conhecimento e ferramentas para melhorar os índices de reciclagem, tratamento e gestão de resíduos sólidos. 

Uma pesquisa divulgada pela Confederação Nacional de Municípios (CNM), em 2020, aponta que, entre os 4.175 municípios ouvidos, apenas 52,2% informaram fazer a disposição final ambientalmente adequada de rejeitos em aterros sanitários, enquanto 47,7% confirmaram o uso de lixões e aterros controlados. Segundo o levantamento, com base em dados da Controladoria Geral da União (CGU) de 2017, seria necessário um investimento de R$ 23,4 bilhões, entre 2014 e 2033, para a destinação adequada dos resíduos. Isso significa um montante de R$ 1,17 bilhão por ano, durante 20 anos, para que em 2033 não haja mais lixões.

A CNM afirma que, atualmente, apenas um programa federal, o “Avançar Cidades Saneamento”, do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), oferece linhas de crédito para a gestão municipal de resíduos sólidos. Mas para ter acesso aos recursos, é necessário preencher várias exigências, como a cobrança municipal pelo manejo de resíduos sólidos, a chamada taxa de lixo. A obrigatoriedade de instrumento de cobrança para acessar recursos federais está prevista no Novo Marco Legal do Saneamento (Lei 14.026/2020).

Paulo Reis destaca que a melhor forma de garantir a destinação correta é criar uma cultura de coleta seletiva dentro da casa das famílias brasileiras. Ele argumenta que o decreto 10.936/2022, que modernizou o marco regulatório dos resíduos sólidos, recomenda a separação entre resíduos orgânicos, recicláveis e rejeitos, com um tratamento individualizado para cada um deles.  

“A melhor solução é separar na fonte, na casa das pessoas, ter regras para separar. Um código de posturas claro de como separar esse material e como colocar para fora de casa para a coleta ser feita de forma adequada. Ter uma coleta seletiva para cada um desses três materiais, que vão para locais diferentes, para tratamentos diferentes e ao final os rejeitos todos são encaminhados para o aterro sanitário”, afirma. 

Para o MMA, o decreto representa uma modernização da Política Nacional dos Resíduos Sólidos e atrai mais investimentos para o setor, além de segurança jurídica e previsibilidade. O texto estabelece a meta de 20 anos para que metade dos resíduos sólidos urbanos gerados sejam aproveitados de alguma forma. Entretanto, o especialista acredita que ainda há muito a ser feito. Segundo Paulo Reis, a legislação criou mecanismos para que os municípios cuidem dos resíduos, mas não apontou a fonte de custeio. 

“Tem que ver a tecnologia apropriada, metodologia mais adequada. Só que a lei não viabilizou as fontes de financiamento para que isso aconteça. Então a gente continua  com um arcabouço legal, que fica facilitando para o município como resolver a sua situação, mas não veio ligado a esse arcabouço legal as linhas de financiamento, linhas de crédito para que tenha recursos financeiros que são necessários para implantar”, pontua. 

Desde 2019, de acordo com o Ministério do Meio Ambiente, 809 lixões foram encerrados e vários sistemas de logística reversa bateram recordes. Como exemplo, a pasta cita a lata de alumínio, que aumentou de 95% para 98,7%, totalizando 33 bilhões de latas recicladas em 2021.

Logística Reversa

A lei 12.305/2010 define a logística reversa como o “instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada”. 

É uma ferramenta que proporciona o retorno de materiais ao ciclo produtivo. A ideia é que resíduos, como embalagens, eletroeletrônicos, baterias e outros retornem ao setor empresarial responsável pela produção para que tenham uma destinação adequada. Em entrevista ao portal Brasil 61, o presidente executivo da Associação Brasileira de Reciclagem Eletroeletrônicos e Eletrodomésticos (ABREE), Sérgio de Carvalho Maurício, explicou como os riscos do descarte inadequado dos produtos podem impactar no meio ambiente e na saúde das pessoas. 

“O prejuízo é bastante grande. Vai muito além da poluição visual. Óleo lubrificante, gases, resíduos dos produtos acabam permeando e contaminando o solo, o que chega aos rios e mares e se torna um problema sério para o meio ambiente e para a população. Há também o problema climático. Os gases refrigerantes comprometem a camada de ozônio, o que tem promovido as mudanças climáticas. Pessoas mais vulneráveis acabam vendendo alguns desses componentes. E essas pessoas, ao se colocarem nesse processo de desmontagem incorreta, acabam em risco”, destaca. 

Segundo o Ministério do Meio Ambiente, existem mais de quatro  mil pontos de entrega voluntária de eletroeletrônicos, responsáveis pela recuperação de mais de 1.200 toneladas do produto. Existem também quatro mil farmácias aptas a receber e fazer a disposição final correta de medicamentos vencidos. Além disso, em 2021, 565 milhões de litros de óleo lubrificante usado foram coletados e enviados para o rerrefino, que é a reciclagem adequada nesse caso. 

O Ministério destaca ainda que cerca de 16 milhões de baterias automotivas foram recolhidas no ano passado, o que possibilitou a reciclagem de 144 mil toneladas de chumbo, produto do qual o Brasil não possui reservas minerais. “Se não tivesse a reciclagem, invariavelmente esse chumbo, se descartado no lugar errado, vai contaminar o solo, contaminar as águas subterrâneas. A reciclagem faz com que ele volte ao ciclo produtivo para virar uma nova bateria, então evita a poluição, preserva recursos naturais, garante mais autonomia e soberania no país e ao mesmo tempo cria mais empregos verdes”, afirma a pasta.