A aguardada série “Senna” finalmente estreia na Netflix nesta sexta-feira (29), entregando uma produção à altura do legado do piloto Ayrton Senna, mas não sem seus tropeços narrativos.
Dividida em seis episódios, a obra percorre desde os primeiros passos do ícone no kart até o trágico acidente no Grande Prêmio de San Marino em 1994, equilibrando momentos de intensidade emocional e falhas estruturais.
A série impressiona visualmente. A fotografia captura com maestria a atmosfera dos anos 80 e 90, alternando entre pistas de corrida e cenários intimistas que remetem às raízes do piloto. Os ângulos de câmera nas cenas de corrida são vibrantes e imersivos, levando o espectador para dentro dos carros, quase sentindo a velocidade que consagrou Ayrton.
A produção é outro ponto alto. Da reconstrução de circuitos à ambientação de cenas internacionais, fica evidente que houve um esforço detalhado para honrar a memória de Senna. Esse zelo é perceptível em cada frame, mesmo nos momentos em que o roteiro deixa a desejar.
Gabriel Leone brilha intensamente no papel de Ayrton Senna. Sua atuação combina carisma e vulnerabilidade, equilibrando os traços de determinação e fragilidade que marcaram o piloto. Leone traduz a complexidade do personagem com delicadeza, evitando caricaturas e oferecendo um desempenho que certamente será lembrado como um dos melhores (me arrisco a dizer) de sua carreira.
O restante do elenco também entrega boas performances. Alice Wegmann, que vive a esposa do piloto, Lílian de Vasconcellos, e Christian Malheiros, que dá vida a Mauro, um dos amigos de infância de Senna, são destaques, trazendo peso dramático às suas cenas.
Contudo, é impossível ignorar a passagem relâmpago de Hugo Bonemer como Nelson Piquet. Apesar de interpretar uma figura crucial no universo de Senna, seu tempo em tela foi decepcionantemente curto, uma oportunidade desperdiçada para enriquecer a narrativa.
Entre as escolhas narrativas que chamam a atenção está a abordagem das relações amorosas de Ayrton. Pâmela Tomé, como Xuxa, ganha destaque significativo, com cerca de 20 minutos de tela espalhados por dois episódios. A apresentadora é descrita como o “grande amor” do piloto, uma descrição que certamente provocará debates.
Já Julia Foti, no papel de Adriane Galisteu, aparece por míseros dois minutos, o que pode ser interpretado como uma tentativa de minimizar a relevância da última namorada de Senna — uma decisão que parece mais influenciada por tensões familiares do que por critérios narrativos.
Enquanto a relação de Senna com Xuxa é explorada de forma quase poética, os roteiristas praticamente ignoram a complexidade de sua história com Galisteu. Essa disparidade não apenas frustra pela falta de equilíbrio, mas também levanta questões sobre até que ponto a série optou por respeitar ou evitar os conflitos familiares que ainda cercam o legado do piloto.
“Senna” é uma série tecnicamente brilhante, mas narrativamente limitada em algumas escolhas cruciais. Apesar dos altos visuais e das atuações de peso, a obra evita polêmicas que poderiam trazer profundidade. No quarto episódio, a pergunta “Xuxa foi realmente o grande amor de Senna?” ecoa tanto dentro quanto fora da tela, simbolizando as nuances deixadas de lado pela produção.
Apesar de seus defeitos, a série oferece uma experiência emocionante, principalmente para fãs do automobilismo e admiradores do piloto. E, no final, ficamos com a dúvida: quem foi realmente o grande amor de Ayrton — Xuxa ou Adriane? Talvez esse mistério nunca seja completamente resolvido, mas a série deixou clara sua preferência.
Nota: 8/10