Furando o Boicote

Israel firma acordo com Conmebol, pode disputar a Copa América

Os ataques israelenses contra a Faixa de Gaza deixaram 33.899 mortos e 76.664 feridos até então, além de oito mil desaparecidos e dois milhões de desabrigados. Dentre as fatalidades, mais de 13.800 são crianças.

Palestinos que perderam membros pelos ataques de Israel treinam futebol em Gaza, em 6 de julho de 2020 [Mahmoud Ajjour/Apaimages]
Palestinos que perderam membros pelos ataques de Israel treinam futebol em Gaza, em 6 de julho de 2020 [Mahmoud Ajjour/Apaimages]

A Associação de Futebol de Israel (IFA) assinou um acordo de cooperação com a Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol), ao abrir as portas para a seleção do Estado ocupante disputar a Copa América e outros torneios de elite no continente, na contramão dos apelos por boicote devido ao genocídio perpetrado em Gaza.

Apesar de estar localizado no continente asiático, Israel integra hoje a União das Associações Europeias de Futebol (UEFA) e não traz indicativos de trocar seus benefícios coloniais pela federação americana.

Conforme o novo acordo, anunciado em 12 de abril, Israel e Conmebol devem ampliar a cooperação no desenvolvimento do esporte, intercâmbio de técnicos e árbitros e programas para jovens e mulheres.

Trata-se de parte dos esforços israelenses denunciados por ativistas como sportswashing — isto é, uso de eventos esportivos como campanha de relações públicas e, consequentemente, propaganda de guerra.

Além de campeonatos entre nações, equipes israelenses — como Maccabi Tel Aviv e Beitar Jerusalém, notórios por cantos racistas nas arquibancadas — podem eventualmente disputar a Copa Libertadores da América.

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A Copa América costuma incluir duas equipes convidadas de outras federações que integram a FIFA. Em 2019, por exemplo, foi a vez de Japão e Catar.

“Tenho esperanças de que a seleção nacional de Israel seja parte de grandes torneios realizados pela Conmebol, quem sabe até mesmo a Copa América”, admitiu Moshe Zuares, presidente da IFA, ao jornal esportivo The Athletic.

“Este é um momento histórico e particularmente excitante”, comemorou o cartola sionista. “Assinamos um acordo com gigantes do futebol, campeões do mundo, países onde o futebol é pedra angular, parte da cultura”.

O acordo é parte da agenda do presidente da Conmebol, o paraguaio Alejandro Dominguez, desde sua visita a Israel em setembro, pouco antes de deflagrar o genocídio em Gaza, em retaliação ilegal a uma operação transfronteiriça do grupo Hamas.

“Durante minha visita a Israel, entendi o quanto amam nosso esporte”, declarou Dominguez ao assinar o acordo, segundo a mídia israelense. “O futebol conecta culturas, não importa a distância geográfica, e pode contribuir para a paz”.

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Durante sua viagem, Dominguez se reuniu também com o ministro do Esporte, Miki Zohar, e o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu. O cartola não visitou, no entanto, os territórios palestinos ocupados, onde o futebol é bastante popular, particularmente pela admiração ao futebol brasileiro.

O acordo contradiz ainda esforços por Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS) que ganharam nova tração nos últimos seis meses, com prejuízo notável a grandes corporações envolvidas com a ocupação israelense, como Starbucks e McDonald’s.

Neste mesmo contexto, a Puma encerrou seu patrocínio à seleção de futebol israelense. Segundo a Campanha de Solidariedade Palestina (PSC), com sede no Reino Unido, a multinacional alemã perdeu milhões de dólares devido à pressão, após anos de piquetes, atos e vigílias em frente a lojas e em eventos com participação da empresa.

Ativistas, organizações de direitos humanos e mesmo governos internacionais — como o Catar, sede da última Copa do Mundo em 2022 — pedem à FIFA que determine o banimento de Israel das competições internacionais.

A medida da Conmebol deve eventualmente deflagrar protestos, comumente silenciados ou punidos pelas federações esportivas e suas empresas patrocinadoras.

Em um incidente na fase classificatória da Copa Libertadores, torcedores do Club Deportivo Palestino — time fundado por imigrantes palestinos no Chile — foram expulsos do estádio por realizarem um protesto. A equipe se classificou.

A pressão envolve diversos esportes, como ciclismo e hóquei. Espera-se manifestações nos Jogos Olímpicos de Paris, entre 26 de julho e 11 de agosto. Em março, organizações palestinas e solidárias reafirmaram apelos para que o Comitê Olímpico Internacional (COI) suspenda a participação de Israel.

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A Associação de Futebol da Palestina, confirmou que 85 atletas, incluindo 55 jogadores de futebol, foram mortos por ataques israelenses desde outubro. Estádios no território mediterrâneo foram transformados em campos de concentração a prisioneiros que, desde então, desapareceram no sistema carcerário de Israel.

A Conmebol é considerada uma vitrine esportiva, ao abarcar três Campeões do Mundo: Brasil (5), Argentina (3) e Uruguai (2), além de Colômbia, Chile, Equador, Paraguai, Peru, Bolívia e Venezuela. Bolívia e Venezuela não possuem relações com Israel.

Países como Brasil e Colômbia mantêm relações — apesar de apelos de movimentos sociais e ativistas pró-Palestina —, todavia, conturbadas por críticas de seus governantes à crise em Gaza e subsequente resposta hostil do regime israelense.

Israel é réu por genocídio no Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), radicado em Haia, que acatou, em 26 de janeiro, a “plausibilidade” da denúncia sul-africana sobre os crimes perpetrados em Gaza. O processo deve durar anos.

Os ataques israelenses contra a Faixa de Gaza deixaram 33.899 mortos e 76.664 feridos até então, além de oito mil desaparecidos e dois milhões de desabrigados. Dentre as fatalidades, mais de 13.800 são crianças.

As ações israelenses são punição coletiva, crime de guerra e genocídio.

Do MEMO