Juiz da Lava Jato no RJ, Bretas é acusado de negociar penas e influenciar eleição

Um áudio apresentado como prova de uma delação já aprovada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) mostra o juiz Marcelo Bretas, responsável pelos processos da Lava Jato no Rio de Janeiro, negociando penas, orientando advogados de defesa e fazendo combinações com o Ministério Público.

As provas foram apresentadas pelo advogado criminalista Nythalmar Dias Ferreira Filho e parte do material foi divulgado na edição desta semana da revista “Veja”. O advogado conta que ficou assustado por ter sido alvo de mandados de busca e teve celular e computadores apreendidos pela Polícia Federal em outubro do ano passado.

Na época, ele procurou o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), um dos maiores críticos no Poder Judiciário da Operação Lava Jato. Nythalmar apresentaria “provas de graves ilegalidades”, segundo a revista. Mas, sem saber do que tratava, Gilmar não respondeu ao pedido de uma audiência.

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Cinco meses depois, o advogado assinou o acordo de colaboração com a PGR. Nos documentos que “Veja” teve acesso, Nythalmar afirma que Bretas não é imparcial, muito pelo contrário.

“Ele se comporta como policial, promotor e juiz ao mesmo tempo: negocia penas, orienta advogados, investiga, combina estratégias com o Ministério Público, direciona acordos, pressiona investigados, manobra processos e já tentou até influenciar eleições – evidentemente tudo à margem da lei”.

Em um dos encontros por videoconferência, participam Nythalmar, um procurador da República encarregado da Lava Jato e Bretas. Na transcrição do áudio obtido pela revista, o juiz afirma que já acionou o Ministério Público e este poderia “aliviar” a pena do empresário Fernando Cavendish, que era cliente do advogado.

“E aí deixa comigo também que eu vou aliviar. Não vou botar 43 anos no cara. Cara tá assustado com os 43 anos”, afirma Bretas, fazendo menção à pena que ele havia imputado ao almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, ex-presidente da Eletronuclear, em 2016, maior pena da operação naquela época.

O advogado sustenta, em sua delação, que a conversa demonstra de forma inequívoca que Bretas, juntamente com outros membros da força-tarefa, montou um esquema paraestatal, ilegal de investigação, acusação e condenação.

“O diálogo demonstra claramente que o juiz não só tinha ciência das colaborações antes de serem fechadas, bem como participava, negociava e intermediava com a ciência, participação e cooperação do MPF nas investigações, fato este gravíssimo”, afirma o delator, chamando atenção para o fato de que a lei proíbe a juízes se aliarem a investigadores, acusadores ou advogados. 

Eduardo Paes

A delação aponta interferência de Bretas na eleição de 2018 para o governo do estado do Rio de Janeiro. O juiz, que já foi punido por participar de atos ao lado do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), divulgou às vésperas do primeiro turno um depoimento em que um ex-assessor do então candidato Eduardo Paes (à época filiado ao DEM) acusava o candidato de fraude de licitações e recebimento de propina.

O delator afirma que ouviu de Bretas que tinha muita antipatia por Paes, que liderava as pesquisas de intenção de voto e perdeu a eleição para um candidato desconhecido, o então juiz federal Wilson Witzel (PSC). Uma das moedas de troca, segundo o delator, foi Witzel, já governador, nomear Marcilene Cristina Bretas, irmã de Marcelo Bretas, para cargo na Controladoria-Geral do Estado.

Vaza Jato

Após a divulgação da reportagem, Bretas se manifestou em sua conta no Twitter: “Afirmações falsas! Fatos distorcidos! A reunião referida pelo advogado de defesa (e por ele gravada) foi feita a pedido do próprio advogado e com a participação do representante do MPF, na 7ª Vara Federal Criminal do RJ”, resumiu o juiz.

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A delação, já aprovada pela PGR, ainda precisa ser aceita e homologada pela Justiça. Na próxima segunda-feira (9), completam-se dois anos que o portal “The Intercept Brasil” publicou a série de reportagens “As conversas secretas da Lava Jato”, mostrando as relações entre o coordenador da força-tarefa, procurador Deltan Dallagnol, e o ex-juiz federal Sergio Moro.

Edição: Eduardo Miranda