O primeiro diálogo oficial entre Donald Trump e Lula desde a imposição do tarifaço norte-americano deixou claro que o ex-presidente Jair Bolsonaro não é mais parte relevante das negociações diplomáticas entre Brasil e Estados Unidos.
Segundo apuração de Andréa Sadi (GloboNews), interlocutores do Planalto confirmaram que o nome de Bolsonaro não foi sequer mencionado durante a conversa telefônica entre os dois líderes nesta segunda-feira (6).
Trump e Lula ignoram Bolsonaro e tratam de comércio e pragmatismo
A conversa, que durou cerca de 30 minutos, concentrou-se em temas econômicos e nas medidas para reverter o impacto das tarifas impostas por Washington sobre produtos brasileiros.
Apesar de o republicano ter citado o julgamento de Bolsonaro pelo Supremo Tribunal Federal (STF) como justificativa para o tarifaço, Trump não retomou o tema no telefonema.
Para o governo Lula, a omissão é um sinal inequívoco de que Bolsonaro foi escanteado das tratativas diplomáticas. Segundo auxiliares do Palácio do Planalto, o republicano demonstrou postura “pragmática e cordial”, priorizando o comércio e a estabilidade política.
“A ligação foi produtiva e sem interferências políticas indevidas. O diálogo tratou de questões comerciais concretas e da necessidade de estabilidade institucional”, afirmou uma fonte próxima à Presidência.
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Bolsonaro fora do jogo e a nova configuração diplomática
Interlocutores citados pelo g1 reforçam a leitura de que o ex-presidente Bolsonaro perdeu espaço político nas negociações. Entre os fatores destacados estão:
- a iniciativa da ligação ter partido de Trump;
- a troca direta de contatos pessoais entre os dois presidentes, eliminando intermediários;
- e o papel central do secretário de Estado norte-americano, Marco Rubio, nas negociações sobre o tarifaço com o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB).
O gesto é visto no Planalto como um avanço diplomático relevante, pois demonstra que os EUA reconhecem Alckmin e não os aliados de Bolsonaro, como Eduardo Bolsonaro (PL-SP) ou Paulo Figueiredo, como canais legítimos de interlocução.
“A Casa Branca voltou a falar com o governo brasileiro de forma institucional, e não ideológica”, comentou um assessor do Itamaraty.
Trump muda o tom e busca reconstruir pontes
A postura de Donald Trump surpreendeu analistas. Conhecido por discursos explosivos e declarações intempestivas, o republicano adotou tom conciliador e evitou ataques ao governo brasileiro. O contraste é evidente em relação à carta enviada em julho, na qual justificava o tarifaço com críticas diretas ao julgamento de Bolsonaro e à atuação do STF.
Para diplomatas brasileiros, a mudança reflete um movimento de reposicionamento pragmático de Trump, interessado em recuperar a confiança comercial com o Brasil e reduzir o isolamento internacional de seu governo.
Ainda assim, o Planalto mantém cautela. A avaliação é que Trump pode, “de uma hora para outra”, retomar o discurso em defesa de Bolsonaro se considerar politicamente conveniente.
Derrota simbólica para o bolsonarismo
Entre os aliados de Bolsonaro, o clima é de frustração e perda de influência. Fontes próximas ao ex-presidente admitem que a ligação entre Trump e Lula reforça a percepção de que a extrema direita brasileira já não detém o monopólio da interlocução com o Partido Republicano.
A situação se agravou após Trump afirmar, durante a Assembleia Geral da ONU, que teve “ótima química” com Lula, a quem descreveu como “um cara muito legal”. A fala foi interpretada como sinal de aproximação inesperada entre dois líderes ideologicamente opostos.
“Trump fala a língua dos negócios; Lula, a da diplomacia. Ambos entenderam que há mais a ganhar cooperando do que confrontando”, analisa um diplomata ouvido pelo Diário Carioca.
Contexto: do tarifaço à reconstrução diplomática
A crise entre Brasil e Estados Unidos começou em julho, quando Trump anunciou uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros, alegando “violação da liberdade de expressão” e “perseguição” a Bolsonaro. A decisão afetou setores-chave da economia, como agronegócio, aço e manufatura, provocando reação imediata do governo Lula.
Na época, o Palácio do Planalto classificou a medida como “arbitrária e politicamente motivada”, reafirmando que o julgamento dos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 é de competência exclusiva da Justiça brasileira.
Agora, o tom mudou. Segundo o Ministério da Fazenda, o diálogo reaberto com Washington representa uma chance de reequilíbrio comercial e um avanço na normalização das relações bilaterais.



