Luzes e sombras das finanças verdes

Ana Tuñas Matilla.

Madri, 29 out (EFE).- O financiamento “verde” está em alta e se posiciona como um grande aliado na luta contra a mudança climática, mas, devido à falta de regulamentação, corre o risco de ser utilizado por empresas e investidores para melhorar sua imagem em vez de ter um impacto real na descarbonização do planeta.

Um dos principais tópicos de debate na cúpula do clima que será realizada em Glasgow, na Escócia, são as finanças verdes e os investimentos com foco em sustentabilidade socioambiental e governança corporativa, ou ESG (Ambiental, Social e Governança na sigla em inglês).

Atualmente, o selo de sustentabilidade é concedido por agências de classificação especializadas que avaliam projetos ou empresas com base em critérios financeiros, ambientais, sociais e de governança corporativa, utilizando suas próprias metodologias de pesquisa.

BÔNUS VERDE, O “ÍCONE DO FINANCIAMENTO SUSTENTÁVEL”.

A modalidade mais difundida é a dos “bônus verdes”, emissões de dívida cujos fundos são utilizados para financiar projetos relacionados à luta contra a mudança climática, como os de energias renováveis, a mobilidade elétrica ou a eficiência energética.

“O bônus verde é o ícone do financiamento sustentável, foi o primeiro produto a aparecer (a primeira emissão foi feita pelo Banco Mundial em 2017) e é o que teve mais desenvolvimento”, disse à Agência Efe Juan Carlos Villanueva, secretário geral do Observatório Espanhol de Financiamento Sustentável (OFISO).

A eles juntaram-se recentemente os títulos vinculados a objetivos de sustentabilidade ou SLBs (Sustainability Linked Bonds), nos quais o emissor se compromete a atingir metas dentro de um determinado período de tempo, como, por exemplo, reduzir suas emissões a um determinado nível, de modo que, se não cumpri-las, será penalizado (pagará mais juros) e, se superá-las, receberá um prêmio.

Do ponto de vista do investimento, existem fundos sustentáveis, que investem apenas em empresas ou projetos que cumprem determinados critérios de sustentabilidade e que são destinados a investidores que, além de obterem rentabilidade, querem combater a mudança climática.

EMISSOR GANHA REPUTAÇÃO, E INVESTIDOR PODE APLICAR EM FUNÇÃO DE ÉTICA E MORAL.

“A tendência é que os investidores discriminem cada vez mais onde investir e onde não”, e por isso é importante conquistar o selo “verde” na hora de atrair fundos para um projeto, disse à Efe Salvador Jiménez, consultor da área de Análise Econômica e Mercados da Analistas Financieros Internacionales (AFI).

A vantagem para os investidores é que eles sabem que suas economias não são destinadas a atividades que vão contra seus valores éticos e morais, enquanto a reputação do emissor é fortalecida, permitindo-lhe diversificar e ampliar suas fontes de financiamento e reduzir seu custo, destacou Jiménez.

REGULAMENTAÇÃO E SUPERVISÃO SÂO CHAVES PARA EVITAR “LAVAGEM VERDE”.

Nesta tendência ascendente, existe o risco da “lavagem verde”: fazer as pessoas acreditarem que certos investimentos ou ações são mais favoráveis ao meio ambiente do que realmente são, ou que algumas empresas fazem investimentos pontuais apenas para melhorarem sua imagem, advertiu Jiménez.

“Se isso não for regulamentado, há o risco de se gerar uma má reputação em relação ao financiamento sustentável. A chave é que haja controles mais rígidos”, afirmou ele, além de apontar que os bancos também estão investindo na concessão de “empréstimos verdes”, tanto para empresas quanto para consumidores, e que isso também requer supervisão específica.

Em termos de regulamentação, ainda há um longo caminho a percorrer, o fenômeno está apenas começando, e por enquanto não há nada vinculativo, além dos compromissos que são assumidos voluntariamente nos prospectos que precedem uma emissão ou nas bases fundamentais de um fundo, advertiu Jiménez.

FINANCIAMENTO VERDE DEVE SER ESTRATÉGICO, NÃO PONTUAL.

Para o secretário geral do OFISO, o importante é que as empresas utilizem este tipo de financiamento “como um vetor estratégico que demonstre seu compromisso com a descarbonização da economia” e que não recorram a ele apenas “pontualmente”.

Ainda de acordo com Villanueva, isso eliminaria a tentação de recorrer ao financiamento sustentável por razões de marketing, e não por elas realmente acreditarem na economia verde.

“É um risco que existe e será combatido através do estabelecimento de regulamentações cada vez mais rigorosas, mais rígidas e padronizadas em todos os países que obrigam aqueles que querem recorrer a este tipo de financiamento a cumprir certos requisitos. Por enquanto, não há regras vinculativas, tudo é propositivo”, afirmou Villanueva.

Além disso, ele ressaltou que o próprio mercado vai impor suas próprias regras e penalizará tudo o que se mostrar insustentável.

No final de agosto, foi divulgado que a SEC, a agência reguladora de títulos dos Estados Unidos, estava investigando a DWS, uma subsidiária do Deutsche Bank, sob suspeita de que estava exagerando seu uso de critérios de investimento sustentável para administrar seus ativos.

Em um relatório, o Banco Central Europeu (BCE) advertiu que embora estes instrumentos sejam importantes para canalizar capital para projetos sustentáveis, existem dúvidas sobre seu real impacto e temores de uma “lavagem verde”. EFE