Retrospectiva 2022: o ano em que o mundo atingiu a marca de 100 milhões de pessoas forçadas a se deslocar

Acompanhe a retrospectiva dos principais acontecimentos no Brasil e no mundo que marcaram o trabalho do ACNUR como um dos mais desafiadores em 72 anos de história.

Guerra na Ucrânia, episódios de xenofobia no Brasil e emergências climáticas fizeram de 2022 um dos anos mais desafiadores para pessoas forçadas a se deslocar e o trabalho do ACNUR em seus 72 anos de história.

Mas não lembraremos de 2022 somente por suas tragédias. Celebramos a inclusão de pessoas refugiadas no Carnaval do Rio, no Dia Mundial do Refugiado e vimos Maha Mamo fazer história gerando conhecimento e movimentando soluções para pessoas apátridas.
 

Ao final de um ano marcado por tantos momentos impactantes, tiramos um momento para lembramos de todas as pessoas que se esforçaram para levar ajuda humanitária aos quatro cantos do globo e todos aqueles afetados por guerras, conflitos, perseguições e violações de direitos humanos.


Brutalidade

No dia 24 de janeiro, o congolês Moïse Kabagambe foi brutalmente assassinado em seu ambiente de trabalho no Rio de Janeiro, com apenas 24 de idade. O caso comoveu todo o Brasil, que se mobilizou em solidariedade aos familiares do jovem que chegou ao Brasil em 2014 com a mãe e os irmãos em busca de segurança contra a violência que assola o país onde nasceu, a República Democrática do Congo.


O ACNUR uniu-se à sociedade civil em movimentos de advocacy pela não discriminação de pessoas refugiadas, que resultou na criação do Observatório da Violência contra Refugiados, criada pelo Comitê Nacional para Refugiados (CONARE).

Inclusão: Carnaval

Pessoas refugiadas fizeram parte do desfile do Salgueiro no carnaval carioca deste ano, entoando a resistência cantada pela escola. (©ACNUR/Ruben Salgado)
Pessoas refugiadas fizeram parte do desfile do Salgueiro no carnaval carioca deste ano, entoando a resistência cantada pela escola. (©ACNUR/Ruben Salgado)

Também no Rio de Janeiro, cerca de três meses depois, 20 pessoas refugiadas de 5 diferentes nacionalidades (Angola, Marrocos, República Democrática do Congo, Síria e Venezuela) conheceram o Brasil, o país que os acolheu, sob uma perspectiva diferente: desfilando na Sapucaí em uma das principais escolas de samba do carnaval carioca.
 

Fruto de uma parceria com o ACNUR, a Salgueiro convidou essas pessoas para compor o tema do ano: a luta contra o racismo. Além de estreitar ainda mais os laços com o país de acolhida, a iniciativa foi um momento de muita emoção entre os participantes, que puderam celebrar suas histórias e o acolhimento que receberam no Brasil.
 

Essa jornada foi registrada em um documentário chamado “Resistência, a jornada dos refugiados no Carnaval do Rio”, dirigido por Beca Furtado e produzido pela Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) e pela produtora Rec Design. Recentemente, ganhou na categoria de melhor documentário no São Paulo Film Festival. Assista o trailer aqui.

 Sem precedentes: Ucrânia

Refugiados Ucranianos chegando em um centro de transição após cruzarem a fronteira de Palanca, na Moldávia. (©ACNUR/Andrew McConnell)
Refugiados Ucranianos chegando em um centro de transição após cruzarem a fronteira de Palanca, na Moldávia. (©ACNUR/Andrew McConnell)

O conflito com a Rússia deixou o mundo em pânico com as perspectivas de uma guerra nuclear, e em todo o globo os efeitos da guerra impactaram os preços de combustíveis, alimentos e serviços. Mas o maior custo foram as vidas impactadas pela violência armada que forçou mais de 10 milhões de pessoas a fugirem de seus lares em busca de proteção.
 

Em setembro de 2022, quase 18 milhões de pessoas na Ucrânia precisavam de ajuda humanitária, incluindo mais de 6 milhões de pessoas deslocadas pelo conflito. Em novembro de 2022, mais de 7,8 milhões de refugiados da Ucrânia foram registrados em toda a Europa.
 

Um novo recorde. De novo.

Oleksandra, forçada a fugir de seu lar na parte leste da Ucrânia, leva consigo cobertores e roupas quentes para o quarto que divide com sua família em um abrigo na parte oeste do país. (©ACNUR/Igor Karpenko)
Oleksandra, forçada a fugir de seu lar na parte leste da Ucrânia, leva consigo cobertores e roupas quentes para o quarto que divide com sua família em um abrigo na parte oeste do país. (©ACNUR/Igor Karpenko)

Pelo 7° ano consecutivo, o mundo testemunha a curva crescente do número de pessoas forçadas a se deslocar no mundo. Em junho, os dados oficiais registraram a triste marca de 100 milhões de refugiados, solicitantes da condição de refugiado e deslocados internos no mundo, ou seja — pessoas forçadas a se deslocar por guerras, conflitos, perseguições e violações de direitos humanos.
 

Parte do “acúmulo” dos números, ou a razão pelas quais essas estatísticas apenas crescem, deve-se não só ao surgimento de novas crises, mas da não resolução de crises antigas.
 

Em outubro, o ACNUR anunciou um outro recorde, igualmente chocante: um déficit de 700 milhões de dólares, maior desfalque orçamentário de sua história. Com essas restrições, a organização é forçada a cortar programas de extrema necessidade e não permite com que sejam desenvolvidos os programas de soluções duradouras para pessoas que vivem há anos — ou até mesmo décadas — na dependência de assistência humanitária.
 

Obrigado, Brasil!
 

No Dia Mundial do Refugiado (20 de junho), o Brasil recebeu uma singela homenagem das pessoas refugiadas que foram acolhidas no país através de uma projeção feita nas duas torres do Congresso Nacional, que estampou: “Obrigado, Brasil!”
 

Até agora, o país já reconheceu mais de 63 mil pessoas como refugiadas, sendo que a maioria são oriundas da Venezuela, Síria e Senegal. Confira os dados atualizados aqui.

 

Inundações no Paquistão

As mudanças climáticas estão reconfigurando as formas e diretrizes de se pensar deslocamento forçado e respostas emergenciais, e em 2022 testemunhamos desastres climáticos afetando gravemente populações inteiras.
 

O caso mais emblemático foram as inundações no Paquistão, que afetaram mais de 33 milhões de pessoas — incluindo uma parcela significativa de refugiados no país. Entre Nigéria, Chade, Níger, Burkina Faso, Mali e Camarões, já são 3,4 milhões de pessoas afetadas também por enchentes somente em 2022.
 

Afegãos no Brasil
 

A crise que se iniciou em 2021 se manteve como um dos principais focos de atuação do ACNUR a nível global e no Brasil, que nos últimos 12 meses — segundo dados do Ministério das Relações Exteriores -emitiu de cerca de 5,8 mil vistos humanitários para pessoas afetadas pela atual crise no Afeganistão.
 

Neste mesmo período, de acordo com informações da Polícia Federal, o país registrou a entrada em território nacional de mais de 2,2 mil pessoas afegãs.
 

De acordo com dados do ACNUR, cerca de 600 pessoas do Afeganistão já foram atendidas pela agência e suas organizações parceiras no Brasil no último ano — desde a publicação da Portaria Interministerial n. 24, de 3 de setembro de 2021, que estabeleceu a concessão dos vistos humanitários e autorização de residência por razões humanitárias para nacionais afegãos, apátridas e pessoas afetadas pela situação naquele país.
 

Mais do que merecido: cidadã e condecorada!

Maha Mamo recebeu a insígnia da Ordem de Rio Branco no Palácio Itamaraty, sede do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, em Brasília. (©ACNUR/Vanessa Beltrame)
Maha Mamo recebeu a insígnia da Ordem de Rio Branco no Palácio Itamaraty, sede do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, em Brasília. (©ACNUR/Vanessa Beltrame)





Apesar de todos os desafios, o ano se encerra com uma vitória: a ex-apátrida Maha Mamo foi condecorada com a insígnia da Ordem de Rio Branco, Grau de Cavaleiro, por sua atuação cívica pelo fim da apatridia, condição em que vivem por 30 anos até ser reconhecida como cidadã brasileira em 2018.
 

“É com muito orgulho que continuarei a levar o nome e o bom exemplo do Brasil para todos os países onde eu estiver. É uma grande honra receber este tão importante reconhecimento da diplomacia brasileira”, afirmou Maha, que dedicou a nova conquista a todas as milhões de pessoas apátridas no mundo.
 

Estima-se que mais de 10 milhões no mundo sejam apátridas, ou seja, não possuam nacionalidade, registro ou documentação que comprovem sua existência, tornando essa população especialmente marginalizada e sem acesso a direitos básicos.

Leia mais aqui.