quarta-feira, fevereiro 19, 2025

Brasil reafirma compromisso com a liberdade de expressão durante visita de trabalho de relator da OEA

Relator especial da Comissão Interamericana de Direitos Humanos discutiu, com representantes dos três poderes, medidas que o país tem adotado
A ministra Macaé Evaristo (Direitos Humanos e Cidadania) durante reunião de trabalho com integrantes da comissão da OEA. Foto: MDHC
A ministra Macaé Evaristo (Direitos Humanos e Cidadania) durante reunião de trabalho com integrantes da comissão da OEA. Foto: MDHC

O relator especial para a Liberdade de Expressão (RELE) da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA), Pedro Vaca, fez, nesta semana, a convite do Governo Federal, sua primeira visita oficial ao Brasil. A agenda incluiu reuniões com autoridades dos Três Poderes e com lideranças da sociedade civil e do meio acadêmico para discutir as medidas que o Brasil tem adotado para preservar a liberdade de expressão e a integridade da informação, ao mesmo tempo em que combate desinformação, disseminação de notícias falsas e discurso de ódio.
 

“O crescimento de uma cultura extremista no país acabou provocando um maior número de mortes em ataques premeditados por meio das plataformas digitais sem mediação, sem mecanismo para enfrentar esse ódio, sem a formação da sociedade para lidar com isso e entender como esse processo tem produzido esses episódios no país”

Macaé Evaristo, ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania

Ao apoiar o trabalho da Comissão, o Governo Federal reafirma seu compromisso com a liberdade de expressão e de imprensa como pilares do Estado Democrático de Direito, ressaltando sua disposição para o diálogo e a troca de experiências sobre esses e outros temas correlatos.
 

COMUNICAÇÃO – A visita do Relator teve início no domingo (9), quando manteve reunião na Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (SECOM), recebido pelo Secretário Executivo da pasta, Tiago César dos Santos, pelo Secretário de Políticas Digitais, João Brant, e pela chefe de Gabinete do ministro, Samara Castro.
 

Na ocasião, foram apresentadas as estratégias e políticas públicas adotadas no atual governo para combater a desinformação e promover a defesa de direitos dos cidadãos no ambiente digital. Tambem recebeu informações, com base nos inquéritos realizaods e nas investigações em curso, a respeito da construção e da massificação de narrativas e informações falsas, de forma coordenada, que levaram aos eventos do 8 de janeiro de 2023 e à premeditacao do assassinato de figuras proeminentes do governo eleito e do STF. Pôde, ainda, conhecer a importância conferida pelo governo ao avanço da regulamentação das redes sociais e do desenvolvimento e utilização da Inteligência Artificial, tanto no cenário nacional, por meio dos Projetos de Lei em discussão no Congresso, quanto na cooperação com governos de outros países.
 

DIREITOS HUMANOS — Na segunda-feira (10), em reunião com Pedro Vaca, a ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), Macaé Evaristo, abordou pautas como a proteção de crianças e adolescentes e de outros grupos historicamente vulnerabilizados no Brasil, além do combate ao discurso de ódio nos ambientes digitais. No encontro, a ministra citou o contexto das violências que afetam a infância e adolescência no país e a relação com o discurso de ódio. “Desde 2001, foram 43 ataques a escolas no Brasil. Só para chamar a atenção, 21 destes ataques ocorreram entre fevereiro de 2022 e outubro de 2023; 48,8% ocorreram neste período e nós temos uma leitura sobre isso”, pontuou.
 

“O crescimento de uma cultura extremista no país acabou provocando um maior número de mortes em ataques premeditados por meio das plataformas digitais sem mediação, sem mecanismo para enfrentar esse ódio, sem a formação da sociedade para lidar com isso e entender como esse processo tem produzido esses episódios no país”, completou a ministra.
 

Macaé Evaristo entregou a Pedro Vaca o documento final do grupo de trabalho (GT) criado no âmbito do MDHC. O “Relatório de recomendações para o enfrentamento ao discurso de ódio e ao extremismo no Brasil” aponta as principais manifestações de ódio e extremismo a serem enfrentadas, como a violência nas escolas, atos antidemocráticos, racismo, xenofobia, homofobia, misoginia e intolerância religiosa. O GT foi composto por representantes do Estado e da sociedade civil.
 

DEMOCRACIA — O relator também se encontrou com representantes do Poder Judiciário. Na segunda-feira (10), a reunião foi com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, e o ministro Alexandre de Moraes. Barroso contextualizou o conjunto de fatos ocorridos no país que colocou em risco a institucionalidade e exigiu a firme atuação do Supremo. Entre estes fatos estavam incluídos discurso de parlamentar que defendia a agressão a ministros do Supremo, juntamente com inúmeras ofensas, e situações de risco democrático, como a politização das Forças Armadas, os ataques às instituições, além do incentivo a acampamentos que clamavam por golpe de Estado. Esse conjunto de fatos resultou nas invasões dos prédios dos três Poderes em 8 de janeiro de 2023.
 

CONTEXTO – Já o ministro Alexandre de Moraes expôs o contexto de todas as investigações e narrou, detalhadamente, as circunstâncias que levaram à suspensão da rede social X, após descumprimento reiterado de decisões do Supremo e retirada dos representantes no Brasil. Moraes expôs ainda que cerca de 1.900 pessoas foram denunciadas após os ataques de 8 de janeiro e que, atualmente, 28 investigados têm perfis em redes sociais bloqueados por ordem do STF – oito no inquérito que apura ameaças ao STF, 10 no inquérito dos atos antidemocráticos e 10 no inquérito que apura tentativa de golpe de Estado.

O ministro Jorge Messias (AGU) durante audiência com os integrantes da comissão da OEA. Foto: Foto: Emanuelle Sena/ AscomAGU
O ministro Jorge Messias (AGU) durante audiência com os integrantes da comissão da OEA. Foto: Foto: Emanuelle Sena/ AscomAGU

FAKE NEWS — A defesa da liberdade de expressão, dos direitos humanos e da democracia brasileira foram os principais temas abordados durante encontro na terça-feira (11) entre Pedro Vaca e o ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, que apresentou um relato minucioso sobre as iniciativas da instituição nesse sentido. O ministro entregou ao relator especial o relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que cita o Brasil como um dos países mais vulneráveis à disseminação de notícias falsas. “Isso tem nos causado diversos problemas. Para além do discurso de ódio, há situações em que o prejuízo para a população é real”, disse.
 

“A disseminação de notícias falsas tem nos causado diversos problemas. Para além do discurso de ódio, há situações em que o prejuízo para a população é real”

Jorge Messias, ministro da Advocacia-Geral da União
 

VACINA – Entre os exemplos de prejuízos aos cidadãos o ministro citou campanhas de fake news associando a vacina contra a Covid 19 a risco de contração do vírus HIV; mentiras veiculadas em redes sociais que prejudicaram o acesso a ajuda das vítimas das enchentes do Rio Grande do Sul; e o crime contra a ordem econômica representado por mentiras recentemente divulgadas sobre o PIX.
 

REGULAÇÃO — Na avaliação de Messias, o debate sobre a regulação das plataformas digitais que a AGU promoveu em janeiro por meio de audiência e consulta públicas é fundamental “porque as indenizações e a remoção de conteúdo não têm sido suficientes para lidar com esse sofisticado sistema de desinformação, que tem levado a atos concretos de violência no Brasil”.
 

AÇÕES MINISTERIAIS — O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, também se reuniu com o relator especial, na quarta-feira (12), e reafirmou o compromisso do Brasil com o direito à liberdade de expressão, bem como com a integridade da informação e o combate à desinformação. Ainda no Itamaraty, em reunião interministerial, representantes de pastas como das Mulheres, Justiça e Segurança Pública, Meio Ambiente e Mudança do Clima, Fazenda e da Saúde apresentaram questões sobre o impacto de ações de desinformação nas políticas de seus ministérios.

O ministro Celso Amorim (Relações Exteriores) com Pedro Vaca, da OEA. Foto: Carlos Cruz/MRE
O ministro Celso Amorim (Relações Exteriores) com Pedro Vaca, da OEA. Foto: Carlos Cruz/MRE

ELEIÇÕES — Na quarta-feira (12), a presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Cármen Lúcia, reuniu-se, por cerca de uma hora, com Pedro Vaca e sua equipe. A ministra respondeu a dúvidas sobre o sistema eleitoral brasileiro, o funcionamento da Justiça Eleitoral e a legislação eleitoral. Além disso, falou sobre a atuação do TSE no combate à desinformação, a eficiência e a segurança das urnas eletrônicas, bem como explicou que o código-fonte dos equipamentos é disponibilizado para testes de interessados (especialistas, partidos políticos, entre outros) um ano antes da eleição — antigamente, esse prazo era de seis meses.
 

CONGRESSO — Pedro Vaca também se reuniu com parlamentares na terça e na quarta-feira e recebeu deles o relatório das investigações do Congresso Nacional sobre os ataques às sedes dos Três Poderes, em 8 de janeiro de 2023. A senadora Eliziane Gama (PSD-MA), que foi relatora da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro, disse que a reunião foi positiva por ter mostrado a Vaca que, através da atuação do Congresso e da relação com os demais Poderes, a liberdade de expressão no Brasil “está assegurada de forma legítima”. Para Eliziane, a OEA precisa ter um panorama completo a partir dos vários atores políticos.
 

MAIS ENCONTROS — Na terça-feira (11), a reunião foi na Polícia Federal, com a apresentação de vídeos sobre o 8 de Janeiro, inquéritos, ameaças a membros do governo, entre outros assuntos. Pedro Vaca também teve reuniões com parlamentares no Congresso. A missão do relator terminou nesta sexta-feira (14), em São Paulo. Após a conclusão da visita, espera-se que a CIDH apresente um relatório final com impressões sobre as informações coletadas no país.
 

TRADIÇÃO — O Brasil mantém tradição de convidar e receber visitas de relatores de organismos internacionais na área de direitos humanos, tendo em conta a importância do diálogo e intercâmbio com mecanismos de direitos humanos para o fortalecimento das políticas e iniciativas desenvolvidas no país. Em 2024, o Brasil recebeu igualmente visitas de relatores especiais da Organização das Nações Unidas sobre formas contemporâneas de racismo; violência contra crianças; e situação das pessoas defensoras de direitos humanos, bem como do Relator Especial sobre Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais da Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

Redacao

Equipe de jornalistas do Jornal DC - Diário Carioca