Movimentos criticam prefeito de BH por troca no comando da secretaria de Política Urbana

               Com a saída de Alexandre Kalil (PSD) e a posse de Fuad Noman (PSD) como prefeito de Belo Horizonte, uma das substituições mais significativas ocorreu na condução da Secretaria Municipal de Política Urbana (SMPU). Sai a arquiteta e urbanista Maria Caldas e entra o administrador de empresas João Antônio Fleury Teixeira, ex-secretário adjunto da Fazenda.
Consta na página oficial da prefeitura que a SMPU existe para promover uma cidade organizada, acessível, que garanta segurança e qualidade de vida a toda a população. Por isso, segundo especialistas, a mudança tem provocado preocupações em entidades que defendem o direito à cidade, como movimentos ambientais, de luta por moradia e de mobilidade urbana.
Pressão do setor imobiliário
A saída de Maria Caldas da secretaria foi antecedida por pressões vindas do empresariado do setor imobiliário e de parlamentares ligados ao setor na Câmara Municipal. Em pedido para instaurar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) contra a secretária, em fevereiro deste ano, vereadores alegaram que Caldas estaria “atrapalhando empresários e o desenvolvimento imobiliário”.
:: Onix pede autorização para mineração em Serro (MG); pesquisa questiona informações apresentadas ::
Edneia Aparecida de Sousa, presidenta do Centro Comunitário Pró-Construção e Desenvolvimento do Taquaril, lembra que empresários chegaram a mover uma campanha de ataques contra a secretária.
“Ela foi mais atacada que o próprio Kalil. Era uma coisa absurda. Ela não podia participar das reuniões do Conselho Municipal de Política Urbana (Compur) porque eles não permitiam”, relata Edneia, que também é conselheira do Compur.
Para Jupira Mendonça, coordenadora do núcleo RMBH do Observatório das Metrópoles, os ataques ocorriam porque Maria Caldas não permitia a interferência de grandes grupos econômicos, como o setor incorporador e a construção civil, na política urbana da prefeitura.
“Esses grupos tinham uma entrada muito grande no governo anterior, de Márcio Lacerda. O Sinduscon [Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado de Minas Gerais] tinha uma entrada direta na Secretaria de Regulação Urbana e mesmo no Planejamento”.
Agora, o temor é que essa interferência volte a ocorrer na SMPU. Praticamente toda a experiência do novo secretário na gestão pública se deu na área econômica. Ele foi funcionário de carreira do Banco Central e membro do Conselho de Política Monetária, atuou como presidente do Conselho de Administração da Copasa e foi diretor financeiro do Banco de Desenvolvimento do Estado de Minas Gerais (BDMG).
Leia mais: "Congresso Nacional está distorcendo política urbana do país", alerta especialista
“No momento em que se tem na Secretaria uma pessoa do setor financeiro, sem nenhuma experiência na política urbana, podemos esperar alguma alteração contra o interesse público. Há um risco grande de voltarmos a um estado de coisas em que o Planejamento e a Regulação Urbana tinham uma interferência direta do setor privado”, pontua a arquiteta.
Plano Diretor e moradia
Um dos pivôs do conflito entre a gestão Kalil e o setor imobiliário nos últimos anos tem sido o novo Plano Diretor de BH (Lei 11.181/2019). O ponto mais polêmico foi a instituição da outorga onerosa do direito de construir, muito atacado pelo Sinduscon e pela Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg).
A outorga é uma contrapartida cobrada dos grandes empreendimentos imobiliários quando a área construída (somando os diferentes andares e descontados afastamentos e outros espaços) for maior que o próprio terreno. A lei também estabeleceu que o dinheiro arrecadado vá para a produção de moradia popular e para o desenvolvimento de áreas que necessitam de mais investimento público.
Leia também: Quase 9 mil vivem nas ruas de BH: "A única coisa que eu quero é um lar para meus filhos”
Para reverter esse avanço, o empresariado pode tentar provocar uma revisão do Plano Diretor ou interferir na sua regulamentação, diminuindo o valor da outorga, criando exceções ou destinando o dinheiro para áreas de interesse dos empreendimentos, e não do conjunto da população.  
“Esses empresários que constroem um apartamento por andar não têm problema com o plano em si, mas com a outorga onerosa. Para eles, a outorga tirou dinheiro. Ora, se eles mexem na outorga, mexem também nas prioridades que estabelecemos no Plano Diretor, de investimento nas áreas da periferia que não tinham previsão de recursos e na habitação”, afirma Edneia Aparecida de Souza.
Outra ameaça paira sobre projetos do município, já em andamento, de urbanização e regularização de ocupações urbanas, como nas comunidades do Jatobá e da Izidora.
Já foi encaminhado à Câmara um projeto de autorização de empréstimo, que foi reprovado na Câmara, em torno de R$ 90 milhões. Agora, temos a notícia de que Fuad assumiu a prefeitura fazendo um aceno à Câmara. Penso que ele deveria voltar às tratativas para esse financiamento, que também inclui obras na Vilarinho. E que seja mantido o desenho participativo dos projetos”, defende Jupira.
Meio ambiente
Também causa preocupação a pauta ambiental. Edneia cita como exemplo a mineração clandestina na Serra do Curral, inclusive de madrugada, na região Leste da capital. “A gente não entende porque esse pessoal opera à noite, sem licença e sem autorização, e porque ninguém faz nada, se todo mundo sabe”, questiona.
:: Instituto entra na Justiça para impedir mineração na Serra do Curral, em Belo Horizonte ::
Em 2021, o Brasil de Fato MG noticiou que a Taquaril Mineração S.A. (Tamisa) tenta obter licenças para explorar 30 milhões de minério na região, a 500 metros de casas da comunidade Taquaril e a sete quilômetros do centro da capital. De acordo com a reportagem, o empreendimento cruzaria duas vezes uma adutora da Copasa, podendo atingir a captação de Bela Fama, em Nova Lima, responsável pelo abastecimento de 40% da Grande BH.
Outro projeto, criticado pelo movimento ambiental, era desenvolvido pela Mineradora Pau Branco (Empabra) e foi suspenso em 2018 pela Secretária de Estado do Meio Ambiente. De acordo com o órgão, a Empabra não cumpriu compromissos firmados em 2017 em Termo de Ajustamento de Conduta. Segundo a CPI da Mineração na Câmara Municipal, as atividades da mineradora podem ter causado uma instabilidade no Pico Belo Horizonte.
Mobilidade urbana
Com a extinção da BHTrans, no final do ano passado, as questões de mobilidade em BH, como a fiscalização do trânsito e a concessão de serviços de transporte, entre outras, agora ficam sob a responsabilidade da Superintendência de Mobilidade do Município, uma autarquia vinculada à política urbana.
Em decreto publicado na terça-feira (12), a prefeitura criou um grupo de trabalho para pensar políticas de mobilidade na cidade. O grupo surge em meio à polêmica do aumento da passagem de ônibus na cidade, de R$4,50 para R$5,85, concedida pela Justiça ao Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros (SetraBH).
“A mobilidade está se tornando insuportável. O último anúncio que tem é do aumento da passagem, com um serviço cada vez pior. A gente precisa saber quem vai assumir o espaço de regular isso”, questiona Edneia.
        Fonte:  BdF Minas Gerais
   Edição: Larissa Costa