Violência no trânsito: Distrito Federal registra média de duas mortes de ciclistas por mês

               No domingo (17), o Distrito Federal registrou mais duas mortes de ciclistas. Somente no primeiro trimestre deste ano outros quatro acidentes com vítimas fatais foram registrados nas vias da cidade, de acordo com dados da Secretaria de Estado de Segurança Pública do DF.
No final de semana, em Santa Maria, o casal Hilberto Oliveira da Silva, de 47 anos, e Vera Lúcia da Cruz Sampaio, de 43 anos, perderam a vida devido à imprudência de uma motorista que dirigia embriagada, segundo informações da Polícia Militar. O nível verificado pelo bafômetro era de 0,66 miligrama por litro de ar alveolar, quantidade superior ao mínimo necessário para a prisão do condutor que é de 0,3mg/l.
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Manifestação
Familiares e amigos de Hilberto Oliveira da Silva e Vera Lúcia Sampaio farão uma manifestação por Justiça nesta terça-feira, 19, às 18h30, no Estacionamento do BRT em Santa Maria, região administrativa do Distrito Federal.
Homicídio culposo
A motorista que atropelou e matou o casal foi autuada por homicídio culposo, quando não há intenção de matar, e liberada após a audiência de custódia, realizada nesta segunda, 17. Ela responderá ao processo em liberdade.
Hilberto e Vera Lúcia se somam aos mais de 230 ciclistas vítimas de atropelamentos nas ruas do Distrito Federal nos últimos dez anos. O número contabiliza os registros de janeiro de 2012 a março de 2022, com uma média de duas mortes por mês.
Em muitos dos casos, os ciclistas são vítimas da mistura do álcool, direção e impunidade.
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Em outubro de 2020, a pedagoga Nádia Bittencourt e seu amigo Ricardo Campelo Aragão foram atropelados enquanto pedalavam na Asa Norte. Ela teve escoriações. Ricardo não resistiu aos ferimentos e morreu no local.
O motorista, Marcelo Damasceno Barroso, fugiu sem prestar socorro às vítimas. Após 17 meses do ocorrido, o resultado da investigação foi divulgado pela Polícia Civil, que indicou que o acusado havia ingerido bebida alcoólica e estava acima de 100 km/h no momento do acidente. Com a conclusão das investigações, o motorista poderá ir a júri popular.
A pedagoga conta que Ricardo estava feliz. “Ele estava saindo de uma depressão de 30 anos. A mãe tinha dado a nova bike. Falamos sobre a vida, sobre o cuidado com as nossas mães, sobre filhas, sonhos, esperanças. Depois decidimos ir para casa, e, infelizmente, ele [Barroso] cruzou o nosso caminho. Ceifou a vida do Ricardo e quase ceifa a minha”.
Assumindo o risco de matar
A ciclista ressalta que a demora na apuração gerou uma tristeza profunda: “O atropelador não nos socorreu, se evadiu, não ligou para os bombeiros e nem para a polícia. Se embriagou e assumiu o risco de matar. Após o atropelamento só se preocupou em esconder o carro e depois se locomover a pé até a sua casa que é próxima do local do acidente e após poucos minutos de nos atropelar, receber uma pizza. É revoltante, triste e lamentável”.
Vídeos levantados pela Polícia mostram Barroso recebendo uma pizza na portaria do prédio em que reside poucos minutos após a morte de Ricardo.
Para Bittencourt, a impunidade dos infratores “gera mais violência no trânsito. É preciso mudar com urgência o Código de Trânsito Brasileiro e ao menos igualá-lo ao Código Penal para que não haja impunidade. Caso contrário, os motoristas continuarão matando e deixando sequelas nos sobreviventes e em suas famílias”.
No início de abril, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu anular a condenação do motorista Johann Homonnai que, em 2017, atropelou e matou o ciclista Raul Aragão, na via da L2 Norte.
A ONG Rodas da Paz escreveu nas redes sociais que “Raul Aragão teve morte brutal e precoce, aos 23 anos, sob o impacto de um veículo dirigido a 95 km/h na via L2 Norte, cuja velocidade máxima admitida é de 60 km/h.”
“Para a sociedade gerou duas mensagens. Às vítimas de crimes no trânsito e aos seus familiares soa como se buscar Justiça seja uma batalha fadada ao fracasso ou à desolação. Aos que dirigem de forma violenta, a certeza de que, ao final, tudo acaba bem”, aponta a nota da ONG.
De acordo com a Secretaria de Transporte e Mobilidade (Semob), Brasília possui uma das maiores malhas cicloviárias do Brasil. São mais de 630 quilômetros de ciclovias e ciclofaixas, disponível em 28 Regiões Administrativas.
Políticas insuficientes
No entanto, para Nádia Bittencourt, a atuação do governo em políticas públicas que estimule o uso da bicicleta e outros modais é muito tímida. “Vemos o tempo todo o governo abrindo novos viadutos, alargando vias, investindo sempre em quem tem carro. É preciso investir mais nas outras formas de locomoção”, afirma. Ela relata ainda que “muitas ciclovias estão deterioradas, acabam de repente e jogam os ciclistas no asfalto”.
A coordenadora administrativa da Rodas da Paz, Joyce Ibiapina, avalia que a atuação do governo em políticas públicas que estimule ao uso de bicicletas é insuficiente. Para ela, “falta priorizar modais ativos e de transporte coletivo”, que beneficiem os usuários de bicicleta.
“O uso da bicicleta pode ser estimulado de muitas formas e a população do DF tem precisado insistir para que o governo faça o mínimo, como incluir a bicicleta no planejamento da cidade e tomar medidas que ofereçam segurança a quem pedala”, destaca.
Ela ressalta ainda que é necessário garantir uma mobilidade segura a pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, pedestres, ciclistas e grupos vulneráveis que utilizam transporte coletivo.
        Fonte:  BdF Distrito Federal
   Edição: Flávia Quirino