"Crianças estão mais desprotegidas sem vacinação em dia", diz pesquisador da Fiocruz

A imunização contra a poliomielite, que causa paralisia infantil, vem caindo drasticamente nos últimos dois anos, assim como a cobertura vacinal contra outras doenças, segundo o pesquisador Akira Homma, assessor científico sênior de Biomanguinhos, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

Leia mais: Poliomielite: com baixa cobertura vacinal, Brasil corre risco de retorno da doença

A baixa proteção levou o Comitê de Certificação de Eliminação da Poliomielite da Organização Panamericana de Saúde (Opas) a incluir o Brasil na lista de países com alto risco de retorno da poliomelite.

As crianças com menos de cinco anos estão mais vulneráveis a contrair a forma mais grave da doença que provoca paralisia irreversível. Hoje, o Brasil que já teve coberturas acima de 95% da vacina da pólio, registra os mais baixos índices da história. Em 2021, o índice ficou em 67%, enquanto o reforço oral chegou a apenas 52% das crianças.

“Há quase 30 anos, o Brasil não tem nenhum caso de poliomielite. Na década de 80, com a participação de toda sociedade, conseguimos alta cobertura vacinal, em dois dias de Dias Nacionais de Vacinação, eliminamos esta terrível virose do país. Esta queda da cobertura vacinal vem criando um enorme número de crianças desprotegidas pela vacinação”, lembra Homma sobre a estratégia que chegou a imunizar 18 milhões de crianças em um só dia.

Este ano, a Campanha Nacional de Vacinação contra a Poliomielite aplicou pouca mais de 5,5 milhões de doses desde agosto, o que representa apenas 48% das crianças de 1 a 4 anos de idade, segundo o Ministério da Saúde.

Akira Homma aponta que uma das causas para a baixa adesão foi o sucesso da estratégia que livrou o Brasil e a América Latina da circulação do poliovírus em 1994. Cenário que pode mudar se o país não voltar ao patamar de cobertura vacinal recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

“O enorme impacto determinado pelas vacinações com altas coberturas vacinais, resultou em desaparecimento das doenças, mortes, surtos, epidemias, e a população sente uma grande segurança e não sente necessidade de vacinar contra a poliomielite e outras doenças imunopreveníveis”, completa.

Segundo a Fiocruz, o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece duas vacinas para a pólio. A inativada que deve ser aplicada nos bebês aos 2, 4 e 6 meses de idade. E o reforço, feito com a vacina atenuada, que deve ser administrada em gotas entre os 15 e 18 meses e depois, antes dos 5 anos de idade.

Vacina contra a covid

No caso da vacina contra a covid, a ampla imunização foi um fator importante para proteger as crianças na pandemia, principalmente quando elas ainda não podiam se imunizar. No entanto, na avaliação do médico de família e comunidade Carlos Vasconcellos, a demora na disponibilidade da vacina infantil e falta de campanha ampla de vacinação do Ministério da Saúde prejudicou a adesão das famílias.

“Não tem apoio institucional, a presença do Ministério da Saúde como era no passado, mobilizando as pessoas para vacinar não existe. Como a vacinação [das crianças] foi liberada no momento de melhor controle da pandemia, as pessoas não tem aquele sentimento de urgência. Tem poucos casos, mas um caso de covid grave que pode ser evitado em uma criança já faz diferença”, reforça o médico.

Carlos, que trabalha com atenção primária em saúde, observa que muitas mães perdem um dia de trabalho para levar os filhos na unidade de saúde. São realidades que, segundo ele, criam obstáculos para a vacinação das crianças.

“Para uma mãe conseguir fazer a vacinação da criança em dia, ela tem que ir à unidade de saúde pelo menos sete vezes no primeiro ano. A mãe que muitas vezes não tem direito a licença maternidade porque é trabalhadora informal. São poucos os serviços que funcionam nos finais de semana, à noite. São questões que não eram tão frequentes no passado”, relata Carlos do movimento Nenhum Serviço de Saúde a Menos.

Procurado pelo Brasil de Fato, o Ministério da Saúde afirmou em nota que fortalece os estados nas ações de vigilância epidemiológica em relação às doenças como o sarampo e a poliomielite no país. Além disso, afirma que orienta os estados na realização de ações de vigilância epidemiológica e imunização.

“Em relação à poliomielite, a pasta tem destacado a importância da vacinação para crianças menores de cinco anos e da vigilância ativa e sensível das paralisias flácidas agudas em menores de 15 anos de idade”, diz o texto.

Fonte: BdF Rio de Janeiro

Edição: Mariana Pitasse