Força e Determinação

‘Sem combater o racismo, não teremos uma cidade democrática’, diz vereadora Monica Cunha

Em entrevista ao Diário Carioca, a vereadora, criadora da Primeira Comissão de Combate ao Racismo no Rio, também fala sobre o Programa de Atenção Psicossocial às Vítimas da Violência Armada

Monica Cunha - Foto: Divulgação
Monica Cunha - Foto: Divulgação

No dia 4 de junho, a Câmara Municipal do Rio de Janeiro marcou um importante capítulo na história da luta contra o racismo no Brasil, ao aprovar a criação da primeira Comissão Permanente de Combate ao Racismo. Esta é a primeira vez que uma casa legislativa no país institui uma comissão com essa finalidade, estabelecendo um novo patamar no combate ao racismo no ambiente legislativo.

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A comissão foi criada após dez turnos de votação e é fruto do projeto da vereadora Monica Cunha (PSOL). O objetivo central é oferecer uma instância de apoio e acolhimento, utilizando a fiscalização, o debate público e a escuta ativa da população para abordar questões raciais. “É importante ter uma Comissão Permanente de Combate ao Racismo na Câmara Municipal do Rio para de fato priorizar a população negra carioca e colocar uma lupa antirracista na atuação do Executivo, garantindo os direitos de todos os cidadãos. Vamos debater cotidianamente os efeitos do racismo na cidade do Rio de Janeiro”, afirmou a vereadora em entrevista ao Diário Carioca.

Uma das principais conclusões da comissão é que a falta de infraestrutura e a implementação falha de políticas públicas afetam de forma mais severa os moradores de favelas e comunidades. Mesmo representando 56% da população, os negros são o grupo mais vulnerável e marginalizado no acesso à saúde, direito garantido pela Constituição.

Monica Cunha e Luciana Novaes - Foto: Divulgação
Monica Cunha e Luciana Novaes – Foto: Divulgação

A comissão, composta pelos vereadores Monica Cunha como presidente, Thaís Ferreira (PSOL) como relatora e Édson Santos (PT) como membro efetivo, é pioneira ao se destinar especificamente à análise, identificação e recomendação de soluções para questões raciais ao gestor municipal. Monica destacou a importância da permanência dessa comissão: “A importância dessa comissão ter se tornado permanente dentro dessa casa de leis, dentro da Câmara Municipal do Rio de Janeiro, é uma reparação. A casa tem 100 anos de existência e não ter tido, nesses 100 anos, uma comissão específica para tratar, de fato, da prioridade da maior população existente nesse estado, também na cidade e nesse país, é uma situação de racismo muito grave”.

Monica Cunha - Foto: Caio Oliveira
Monica Cunha – Foto: Caio Oliveira

Monica expressou suas expectativas sobre o impacto da comissão na vida da população negra carioca: “A primeira expectativa é que, como a gente sabe que não vamos permanecer eternamente nessa casa, mesmo quando eu, daqui a alguns anos, não seja mais vereadora, ela esteja nas mãos de pessoas que sempre se comprometam com essa causa. Eu vou exigir que sempre esteja nas mãos de negros, sim, mas mesmo que seja um vereador branco, que ele se comprometa e priorize entender que, se não falarmos do racismo e se não o combatê-lo, não teremos uma cidade democrática”.

A comissão visa garantir a implementação efetiva das políticas públicas propostas e fiscalizar a atuação do Executivo. A parlamentar enfatizou: “A comissão, através de quem a compõe, que são vereadores, deve pensar em PELs que promovam transformações para essa população. Fazer uma política de fora para dentro, sempre ouvindo a população do lado de fora para trazer para cá e compor os PELs, porque, de fato, estaremos fazendo uma política inclusiva”.

Programa de Atenção Psicossocial às Vítimas da Violência Armada

Dois dias após a criação da Comissão Permanente de Combate ao Racismo, a Câmara Municipal também aprovou, em segunda discussão, o Projeto de Lei 1739-A/2023, que institui o Programa de Atenção Psicossocial às Vítimas da Violência Armada. O programa, proposto pelas vereadoras Monica Cunha e Luciana Novaes (PT), busca promover ações de contenção e reparação dos danos causados pela violência armada na saúde e na vida dos cidadãos cariocas.

Monica, que teve seu filho assassinado por policiais, ressaltou a importância do programa: “Construi esse programa junto com a vereadora Luciana Novaes, que em primeiro lugar foi pela expressividade que nós mesmas trazemos de nossos corpos. Eu tive meu filho assassinado por este estado, Luciana também foi vítima de uma bala perdida. Enfim, nós temos propriedade de sobra para dizer o que significa um atendimento e acompanhamento desse tipo, não só para nós que somos as vítimas diretas, mas também para as indiretas, que são nossas famílias”.

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A vereadora destacou que o suporte psicológico oferecido pelo programa é crucial para as vítimas de violência armada e suas famílias. Ela apontou as dificuldades enfrentadas por essas vítimas no processo de recomeço: “As principais dificuldades são, primeiro, ser ouvida e acreditada. Geralmente, as pessoas até ouvem ou fingem que ouvem, mas não acreditam. Então, isso é essencial. Depois, é saber das necessidades que você está passando, como o adoecimento, a falta de trabalho, e o impacto disso no relacionamento com seus outros filhos, companheiro ou companheira. É lidar com a sociedade após a tragédia que você viveu. O suporte psicológico é crucial para ajudar essas pessoas a entenderem como viver a partir da tragédia, como voltar a trabalhar, como se relacionar novamente”.

Monica Cunha
Monica Cunha

O programa:

A equipe de atendimento do Programa deverá ser composta por profissionais das seguintes áreas: psicologia, serviço social, direito e saúde. O atendimento oferecido pelo Programa terá as seguintes ações:

  • Acolhimento: a pessoa afetada, vítima direta ou indireta, é acolhida pela equipe multidisciplinar que realizará a escuta especializada, atendendo a demanda apresentada, bem como apresentando o Programa de acordo com a necessidade;
  • Atendimento social: o intuito é a identificação das demandas sociais sinalizadas, bem como verificação dos direitos socioassistenciais correspondentes às necessidades apresentadas;
  • Atendimento em saúde mental: o objetivo é o acompanhamento psicológico de caráter terapêutico, periódico e contínuo, e psiquiátrico às vítimas da violência armada que assim necessitem;
  • Orientação jurídica: o objetivo é prestar atendimento jurídico, identificação e encaminhamento para fins de garantia de acesso à justiça;
  • Atenção integral à saúde: acompanhamento através das unidades básicas de saúde ou acompanhamento especializado através da identificação das demandas em saúde, incluindo a obrigatoriedade e gratuidade da disponibilização de medicamentos.