Trapaça: integrantes da CPMI pedem acesso a documentos de inquéritos em que são alvo

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPMI) do 8 de janeiro terá de votar 285 dos 892 requerimentos protocolados na próxima sessão, prevista para esta terça-feira (13), segundo o presidente da CPMI, deputado Arthur Maia (União-BA). 

Somente da senadora Eliziane Gama (PSD-AM), relatora do colegiado, são 62 requerimentos de convocação, quebra de sigilos e pedidos de compartilhamentos de informações de outros órgãos, como a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e as polícias Militar e Civil do Distrito Federal, de acordo com o seu plano de trabalho. 

Entre os indicados pela congressista, estão Anderson Torres, ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal (DF), Fábio Augusto Vieira, ex-comandante da Polícia Militar do DF, Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF), e Gonçalves Dias, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).   

Uma das preocupações são os requerimentos que pedem acesso eventualmente às investigações que recaem sobre parlamentares investigados, como é o caso do deputado federal André Fernandes (PL-CE). Ele é investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por convocar pelas redes sociais bolsonaristas para os atos criminosos que culminaram na invasão e depredação dos prédios dos Três Poderes, em Brasília.  

André Fernandes (PL-CE) / Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e a senadora Damares Alves (Republicanos-DF), por exemplo, protocolaram requerimentos solicitando ao STF todos os documentos, processos e inquéritos decorrentes das investigações dos atos ocorridos no dia 8 de janeiro de 2023. 

Alguns parlamentares chegaram a pedir a saída de Fernandes no colegiado, o que foi negado pelo presidente Arthur Maia. “Não existe deputado pela metade, ou é deputado e pode participar de qualquer colegiado dessa casa ou não é e não pode fazê-lo. Além disso, essa indicação não compete ao presidente do colegiado e sim ao líder partidário”, disse em sessão. 

Para o deputado Rogério Correia (PT-MG), Fernandes está “participando de uma investigação que ele próprio é indiciado. (…) Não há relação com a opinião política do deputado, mas evidentemente não pode ele sendo investigado e indiciado pela PF fazer parte do inquérito, seria como a raposa tomando conta do galinheiro”. 

André Lozano, professor de direito penal e direito processual, afirma que o acesso a determinadas informações pode comprometer o bom andamento das investigações. Um integrante da CPMI alvo de inquérito, com dados judiciais em mãos, por exemplo, obstruir o processo “com a destruição de documentos, procurar testemunhas para atemorizar ou oferecer favores. O grande problema seria possíveis fraudes processuais que também constituem crimes”, explica Lozano. 

O docente afirma que o Código de Processo Penal pressupõe a suspeição de juiz e promotor em casos em que há relação com as partes (pessoas envolvidas) ou a matéria (o tema do processo). “Agora, quando a gente está falando dos investigadores, por exemplo, delegado ou parlamentares no caso da CPI, o código é silencioso. Por uma questão ética, o correto é a pessoa que têm alguma relação se afastar das investigações.” 

Na mesma linha, Tânia de Oliveira, da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), afirma que o STF não pode se negar a repassar as informações solicitadas, mas há a possibilidade de determinar que somente os membros da CPMI acessem os dados que estão sob sigilo, sob pena de prejudicar a investigação.

Ainda assim, “a rigor um investigado jamais poderia compor o grupo de parlamentares que investigam. A atuação em processo no qual a pessoa é parte ou diretamente interessada desrespeita a previsão legal de suspeição e impedimento, inclusive em CPIs. É completamente sem lógica, e ele pode atuar para atrapalhar as investigações”, afirma Oliveira.

Convocação e quebra de sigilos de Bolsonaro 

A CPMI também deve votar o requerimento do deputado federal Rogério Correia (PT-MG) que pede a quebra dos sigilos bancário, telefônico e telemático do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). No documento, Correia afirma que “os atos de vandalismo e terrorismo referidos foram gestados antes mesmo das eleições com as reiteradas ações do Presidente da República que levantavam suspeitas relativamente à segurança das urnas eletrônicas, a integridade dos ministros da Corte Eleitoral e da Suprema Corte”. 

Para o parlamentar, é possível concluir que Bolsonaro “esteve diretamente envolvido nos preparativos da ação violenta de seus apoiadores, razão pela qual requeiro a quebra de sigilo telefônico e telemático no período entre à realização do segundo turno das eleições, 30.10.2022 e 10 de janeiro de 2023, período imediatamente posterior à ocorrência dos atos de terrorismo”. 

Bolsonaro também é alvo de um requerimento que solicita a sua convocação enquanto investigado pela comissão, protocolado pela deputada Erika Hilton (PSOL-SP) e pelo deputado Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ).  

Ambos afirmam que os ataques de Bolsonaro contra o sistema eleitoral justificam a convocação do ex-presidente enquanto investigado. “Essas falas de Bolsonaro tiveram uma posição de destaque e abrangência de desinformação no país, compondo um rol de motivações, que ao longo dos meses, foram alimentados por campanhas, práticas de atos violentos e atos antidemocráticos em todo o país”, diz o requerimento.

Edição: Rodrigo Durão Coelho