O ex-presidente dos Estados Unidos Bill Clinton revelou que, já no fim dos anos 1990, acreditava que a China ultrapassaria os EUA como maior economia do mundo. A declaração aparece em um novo livro do colunista David J. Lynch, do Washington Post, com trechos divulgados neste mês.
Em entrevista de 75 minutos concedida no inverno de 2024, Clinton reconheceu que sua visão otimista sobre a globalização não se concretizou. “Está acontecendo que não há muito pensamento claro sobre os lados positivos da globalização”, afirmou o ex-presidente democrata.
Globalização e falhas de Washington
À frente da Casa Branca entre 1993 e 2001, Clinton classificou a globalização como “o maior motor de prosperidade que o mundo já viu”. Mas admitiu que Washington falhou em apoiar os trabalhadores prejudicados pela abertura econômica e subestimou o ressentimento social que se acumulava no país.
“Eu pensei o que disse. Achei que eles [os chineses] se tornariam gradualmente mais abertos e inclusivos… E achei que eventualmente nos substituiriam como a maior economia do mundo”, declarou, ressaltando que seu objetivo era garantir que essa transição não representasse ameaça para os EUA nem perigo para a China.
A aposta na China e no livre comércio
Nos anos 1990, Clinton foi um dos arquitetos da entrada da China na Organização Mundial do Comércio (OMC) e do NAFTA, acordo de livre-comércio da América do Norte. À época, acreditava que a interdependência econômica abriria caminho para cooperação política e estabilidade. Hoje, ele se diz menos confiante sobre o futuro das relações bilaterais.
O ex-presidente também destacou que o descontentamento popular nos EUA começou muito antes da ascensão de Donald Trump, e que Washington nunca encarou de frente as consequências sociais da globalização: “Parecia que mal tentava”, afirmou.
Reação social e retrocesso político
Com o passar das décadas, trabalhadores excluídos da “nova economia” se voltaram contra o comércio internacional, a imigração e as transformações estruturais. Clinton descreveu essa insatisfação como uma sociedade “fervendo” de frustrações.
A mudança abriu espaço para o discurso protecionista, consolidado por Trump, que adotou tarifas comerciais e políticas unilaterais contra a China. Para observadores internacionais, os EUA abandonaram progressivamente a defesa de um sistema econômico aberto, movimento que reduziu sua própria competitividade global.
Sinais de fragilidade econômica
Os efeitos dessa guinada já aparecem nos indicadores. Em agosto, os EUA criaram apenas 22 mil novos empregos, abaixo das expectativas, enquanto o desemprego subiu para 4,3%. O déficit comercial também disparou, chegando a US$ 78,3 bilhões em julho, pressionado pelas tarifas e pelo aumento das importações.
Esses dados reforçam que a previsão de Clinton segue atual: a China caminha para consolidar-se como maior economia mundial, enquanto os EUA enfrentam desaceleração e dificuldades em lidar com as consequências internas da globalização que um dia defenderam.