Lula responde a declarações de Trump
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) publicou neste domingo (14) um artigo no The New York Times para reforçar que a democracia e a soberania do Brasil não são negociáveis. A publicação foi uma resposta direta à escalada de críticas da Casa Branca após a condenação de Jair Bolsonaro (PL) pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe de Estado.
Lula destacou seu orgulho pela decisão judicial e rebateu alegações da administração americana de que a condenação configuraria uma “caça às bruxas”. Ele classificou como falsas as acusações de censura e reafirmou que o processo seguiu todos os trâmites legais previstos na Constituição brasileira de 1988.
Tarifas e comércio bilateral
No artigo, o presidente analisou as recentes medidas comerciais dos EUA contra o Brasil, incluindo tarifas de 50% sobre produtos brasileiros. Lula argumentou que os números não justificam sanções econômicas: nos últimos 15 anos, os EUA acumularam superávit de US$ 410 bilhões no comércio bilateral de bens e serviços, com quase 75% das exportações americanas para o Brasil isentas de impostos.
O presidente reforçou que a motivação da Casa Branca para aplicar tarifas é política, ligada à perseguição ao ex-presidente Bolsonaro, e não econômica.
Proteção da democracia e do Estado de Direito
O artigo ressalta que a decisão do STF protege as instituições democráticas e foi fruto de investigações que revelaram planos de Bolsonaro para anular os resultados das eleições de 2022 e cometer crimes contra autoridades brasileiras.
Lula destacou que acusações de censura a plataformas digitais americanas são infundadas, e que leis nacionais se aplicam igualmente a empresas nacionais e estrangeiras, garantindo proteção contra desinformação, discurso de ódio e crimes contra crianças e adolescentes.
Meio ambiente e PIX
O presidente também abordou conquistas ambientais e tecnológicas. Nos últimos dois anos, a taxa de desmatamento na Amazônia foi reduzida pela metade, e medidas de fiscalização apreenderam milhões de dólares em bens relacionados a crimes ambientais.
Sobre o sistema de pagamento PIX, Lula destacou que ele promoveu inclusão financeira, eficiência e segurança, refutando acusações de práticas desleais contra operadores financeiros dos EUA.
Convite à cooperação internacional
Lula concluiu o artigo reafirmando que o Brasil permanece aberto ao diálogo e à cooperação com os EUA, mas deixou claro que a democracia e soberania brasileiras não estão em negociação. Ele citou o discurso de Trump na Assembleia Geral da ONU em 2017 para reforçar que nações soberanas podem cooperar com respeito mútuo, apesar de diferenças culturais e políticas.
Leia a integra do artigo de Lula no The New York Times
Decidi escrever este ensaio para estabelecer um diálogo aberto e franco com o presidente dos Estados Unidos. Ao longo de décadas de negociações, primeiro como líder sindical e depois como presidente, aprendi a ouvir todos os lados e a levar em consideração todos os interesses em jogo. É por isso que examinei cuidadosamente os argumentos apresentados pelo governo Trump para impor uma tarifa de 50% sobre os produtos brasileiros.
Trazer de volta os empregos americanos e a reindustrialização são motivações legítimas. Quando, no passado, os Estados Unidos levantaram a bandeira do neoliberalismo, o Brasil alertou sobre seus efeitos prejudiciais. Ver a Casa Branca finalmente reconhecer os limites do chamado Consenso de Washington, uma receita política de proteção social mínima, liberalização comercial irrestrita e desregulamentação geral dominante desde a década de 1990, justificou a posição brasileira.
Mas recorrer a ações unilaterais contra Estados individuais é prescrever o remédio errado. O multilateralismo oferece soluções mais justas e equilibradas. O aumento da tarifa imposto ao Brasil neste verão não é apenas equivocado, mas também ilógico. Os Estados Unidos não têm déficit comercial com nosso país, nem estão sujeitos a altas tarifas.
Nos últimos 15 anos, acumulou um superávit de US$ 410 bilhões no comércio bilateral de bens e serviços. Quase 75% das exportações dos EUA para o Brasil entram isentas de impostos. Segundo nossos cálculos, a tarifa média efetiva sobre os produtos americanos é de apenas 2,7%. Oito dos dez principais itens têm tarifa zero, incluindo petróleo, aeronaves, gás natural e carvão.
A falta de justificativa econômica por trás dessas medidas deixa claro que a motivação da Casa Branca é política. O vice-secretário de Estado, Christopher Landau, teria dito isso no início deste mês a um grupo de líderes empresariais brasileiros que estavam trabalhando para abrir canais de negociação. O governo dos EUA está usando tarifas e a Lei Magnitsky para buscar impunidade para o ex-presidente Jair Bolsonaro, que orquestrou uma tentativa fracassada de golpe em 8 de janeiro de 2023, em um esforço para subverter a vontade popular expressa nas urnas.
Tenho orgulho da decisão histórica tomada na quinta-feira pelo Supremo Tribunal Federal do Brasil, que protege nossas instituições e o Estado de Direito democrático. Não se tratou de uma “caça às bruxas”. A decisão foi resultado de um processo conduzido de acordo com a Constituição brasileira de 1988, promulgada após duas décadas de luta contra uma ditadura militar. Ela veio após meses de investigações que revelaram planos para assassinar a mim, ao vice-presidente e a um ministro do Supremo Tribunal Federal. As autoridades também descobriram um projeto de decreto que teria efetivamente anulado os resultados das eleições de 2022.
O governo Trump acusou ainda o sistema judiciário brasileiro de perseguir e censurar empresas de tecnologia americanas. Essas alegações são falsas. Todas as plataformas digitais, sejam elas nacionais ou estrangeiras, estão sujeitas às mesmas leis no Brasil. É desonesto chamar regulamentação de censura, especialmente quando o que está em jogo é a proteção de nossas famílias contra fraudes, desinformação e discurso de ódio. A internet não pode ser um terreno sem lei, onde pedófilos e abusadores têm liberdade para atacar nossas crianças e adolescentes.
Igualmente infundadas são as alegações do governo sobre práticas desleais do Brasil no comércio digital e nos serviços de pagamento eletrônico e sua suposta falha em fazer cumprir as leis ambientais. Ao contrário de ser injusto com os operadores financeiros dos EUA, o sistema de pagamento digital do Brasil, conhecido como PIX, possibilitou a inclusão financeira de milhões de cidadãos e empresas. Não podemos ser penalizados por criar um mecanismo rápido, gratuito e seguro que facilita as transações e estimula a economia.
Nos últimos dois anos, reduzimos pela metade a taxa de desmatamento na Amazônia. Somente em 2024, a polícia brasileira apreendeu centenas de milhões de dólares em bens usados em crimes ambientais. Mas a Amazônia ainda estará em perigo se outros países não fizerem sua parte na redução das emissões de gases de efeito estufa.
O aumento da temperatura global pode transformar a floresta tropical em uma savana, alterando os padrões de precipitação em todo o hemisfério, incluindo o meio-oeste americano.
Quando os Estados Unidos abandonam uma relação de mais de 200 anos, como a que mantêm com o Brasil, todos perdem. Não há diferenças ideológicas que devam impedir dois governos de trabalharem juntos em áreas onde têm objetivos comuns.
Presidente Trump, continuamos abertos a negociar qualquer coisa que possa trazer benefícios mútuos. Mas a democracia e a soberania do Brasil não estão em discussão. Em seu primeiro discurso na Assembleia Geral das Nações Unidas em 2017, o senhor disse que “nações soberanas fortes permitem que países diversos, com valores, culturas e sonhos diferentes, não apenas coexistam, mas trabalhem lado a lado com base no respeito mútuo”. É assim que vejo a relação entre o Brasil e os Estados Unidos: duas grandes nações capazes de se respeitar e cooperar para o bem dos brasileiros e dos americanos.
Luiz Inácio Lula da Silva é o presidente do Brasil.

			
		
		
		
		
		
		
		
		
		
		
		
                               
                             
		
		
		
		
		
		
		
		