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Ibrahim Traoré desafia França e lidera ruptura no Sahel

Uagadugu – Aos 36 anos e fardado de desobediência histórica, Ibrahim Traoré vem redesenhando o mapa geopolítico do Sahel com traços ousados de um anti-imperialismo radical. Desde que tomou o poder em setembro de 2022, após mais um golpe militar na África Ocidental, o jovem presidente interino de Burkina Faso assumiu a tarefa de desenterrar a memória revolucionária de Thomas Sankara — não como relíquia, mas como projeto político em marcha.

Com medidas como a expulsão das tropas francesas, a nacionalização das minas, o rompimento com a moeda colonial franco CFA, acordos diretos com China e Rússia, além da criação de bancos estatais, Traoré vem atacando o espólio do neocolonialismo francês com precisão cirúrgica e discurso pan-africanista inflamado. E incomodando profundamente Paris, Washington e toda a velha ordem que ainda lucra com a miséria africana.


Traoré e a nova revolução burquinense

A ascensão de Traoré não é um raio fora da savana. É mais um capítulo da insubordinação política que varre o Sahel, região onde Mali (2020) e Níger (2023) também viram suas elites depostas por militares insatisfeitos com a tutela estrangeira.

Formado em geologia, forjado no front contra jihadistas no norte de Burkina Faso e profundamente influenciado pelo pensamento socialista e pan-africanista, o novo líder assumiu com o discurso de refundação: “Queremos um novo Burkina Faso e uma nova África, livre do imperialismo”, declarou ao frustrar mais uma tentativa de golpe em abril de 2025.


Sankara vive, Paris treme

Comparado por analistas a um “Che Guevara africano”, Traoré resgata não só os ideais de Sankara, mas sua tática: romper as veias abertas da exploração mineral e redistribuir os frutos. “Ele tem feito reformas e distribuído a renda da mineração. Isso garante apoio popular e respeito dentro das Forças Armadas”, afirma o jurista Hugo Albuquerque.

A França, que por décadas manteve tropas, bases, moeda e empresas nas ex-colônias africanas, agora assiste ao colapso de seu poder simbólico e econômico na região. E não está sozinha na inquietação: os Estados Unidos também miram com desconfiança os acenos de Traoré a Moscou e Pequim.


Um continente em disputa

“O que está em jogo é a soberania africana diante da nova ordem global”, explica o historiador Eden Pereira Lopes da Silva, do NIEAAS. Para ele, o governo burquinense entende que não há mais espaço para a submissão econômica e militar a ex-metrópoles.

Na prática, isso significa proibir exportações de alimentos essenciais, estimular a industrialização local e reposicionar Burkina Faso como um elo central da luta por uma África unida, autônoma e anticapitalista. “Traoré assume uma postura contrária ao sistema que explora os países africanos há séculos”, resume Silva.


Golpe, guerra e revolta

O contexto em que floresce a nova liderança é de guerra civil prolongada, com milhares de mortos em combates contra grupos armados islâmicos. Há mais de 15 anos, Burkina Faso é cenário de violência, precariedade e abandono — solo fértil para revoltas militares que respondem à falência dos processos eleitorais convencionais.

“Esses levantes expressam o grito de setores marginalizados que já não confiam no sistema político”, afirma Silva. A crise é também demográfica: o país tem mais de 23 milhões de habitantes, num território equivalente ao Rio Grande do Sul.


Da independência traída à resistência armada

A história recente do país é marcada por farsas institucionais e traições externas. Depois da independência em 1960, o então chamado Alto Volta viveu sob tutela ocidental até a revolução de 1983, que levou Sankara ao poder. Em apenas quatro anos, ele transformou o país com políticas radicais — até ser morto em uma emboscada em 1987, orquestrada por Blaise Compaoré, com apoio da França.

Compaoré governou até 2014, quando foi derrubado por nova revolta militar. O vácuo de legitimidade, a guerra contra o terror e a herança colonial criaram as condições para que Traoré emergisse como líder incontornável.


O Carioca esclarece

Quem é Ibrahim Traoré?
É o atual presidente interino de Burkina Faso, militar nacionalista que assumiu após um golpe em 2022 e se tornou símbolo do pan-africanismo.

Por que ele incomoda França e EUA?
Pelas medidas que minam a influência ocidental: expulsou tropas francesas, rompeu com a moeda colonial e busca alianças com Rússia e China.

Qual o legado de Thomas Sankara?
Líder revolucionário dos anos 1980, Sankara defendeu soberania, igualdade de gênero e rompimento com o imperialismo. Traoré reivindica sua herança.

Como isso afeta a África?
A revolta burquinense ecoa pelo continente e inspira uma nova onda de resistência contra o domínio econômico, político e militar do Ocidente.

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Equipe de jornalistas do Jornal DC - Diário Carioca

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