EUA

"O curativo branco na orelha direita se tornou um símbolo da campanha Republicana", avalia especialista

Professor de Relações Internacionais do CEUB analisa momento político e destaca situação favorável a Trump após atentado

"O curativo branco na orelha direita se tornou um símbolo da campanha Republicana", avalia especialista
Foto: Reprodução

O atentado contra Donald Trump nos Estados Unidos desencadeou impactos na política internacional. Renato Zerbini, professor de Relações Internacionais do Centro Universitário de Brasília (CEUB), analisa o episódio e os desdobramentos para a política internacional após este episódio. O especialista chama atenção aos efeitos deste tipo de violência.
 

Confira a entrevista, na íntegra:
 

O atentado contra Trump era algo previsível?

RZ: A julgar pelo nutrido histórico de atentados contra candidatos e presidentes estadunidenses, a antropologia política dos EUA nos autorizaria a dizer que a factibilidade desse tipo de atentado sempre está presente em sua realidade eleitoral: Abraham Lincoln (1865); William Mckinley (1901); Theodore Roosevelt (1912); Franklin D. Roosevelt (1933); John F. Kennedy (1963); Robert F. Kennedy (1968); George Wallace (1972); Gerald Ford (1975); e Ronald Reagan (1981). Passados 43 anos desde a consubstanciação do último atentado, trata-se de uma chaga ainda marcante no meio político dessa grande democracia. Contudo, raízes históricas indicam que lá qualquer candidato ou presidente convive com a possibilidade real de atentados.
 

Qual é a influência do acesso fácil a armas nos EUA em eventos como o atentado contra Trump?

RZ: A influência é muito grande. Quanto mais fácil o acesso a armas, mais simples e sem obstáculos será para utilizá-las. Os estudos científicos assim indicam.
 

Quais foram as reações imediatas dos políticos ao atentado, e como isso pode ter influenciado a percepção pública?

RZ: O atentado foi imediatamente condenado por todos os políticos. Nos EUA, Republicanos e Democratas, apressaram-se em condená-lo. O que foi muito importante, pois indicou que todos primam pelos pilares de eleições livres, inclusive da violência, em um Estado Democrático de Direito. Isso foi essencial para apaziguar os ânimos do público em geral.
 

De que maneira o atentado contra Trump pode afetar a campanha eleitoral e a dinâmica política nos próximos meses?

RZ: A maioria dos colegas analistas estadunidenses avaliam que Trump o utilizará favoravelmente a seu favor, opacando inclusive os processos e as condenações em seu contra no Judiciário. Trump vender-se-á como aquele que superou um momento de extrema crise, com vitalidade. E isso contrastaria com a imagem de pouca energia de seu oponente Biden. Tendo a concordar com essa avaliação.
 

Você vê paralelos significativos entre o atentado contra Trump e outros atentados políticos recentes, como o de Bolsonaro no Brasil?

RZ: O paralelo é o de um atentado no seio de uma disputa eleitoral. No caso de Bolsonaro e de Trump, ambos foram alvejados por armas (facada naquele e rifle nesse). Em ambos os atentados, há uma história de superação eivada de contornos de um milagre divino capaz de sensibilizar o público religiosamente mais fanático. E, no caso de Trump, até de movimentar mais eleitores para as urnas no dia da eleição (nos EUA facultativa). O fato é que lá um grande curativo branco na orelha direita já se tornou um símbolo atualizado da campanha Republicana.
 

Como a retórica utilizada por Trump contribuiu para o atentado contra ele?

RZ:Na política, como nas relações sociais em geral, violência tende a gerar mais violência. Logo, a retórica de Trump pode sim ter contribuído para o seu próprio atentado.
 

Quais podem ser as consequências a longo prazo desse atentado para a segurança dos candidatos presidenciais nos EUA?

RZ: Falhas nas instituições e sistemas de segurança já foram detectadas. O próprio Presidente Biden já solicitou uma averiguação independente à do FBI sobre o atentado. Ajustes e reformulações nas instituições e sistemas de segurança certamente acontecerão em consequência dessas averiguações ainda em curso.
 

Como vê a resposta de Trump ao atentado em termos de seu discurso político e suas possíveis estratégias de campanha?

RZ: Como um homem de mídia, ex-Presidente e um atual candidato com metade dos eleitores a seu favor, Trump aproveitou com muita estratégia esse brutal e fatídico acontecimento tratando de alavancar a sua imagem de candidato da superação e com muita vitalidade. Não à toa, um grande curativo branco na orelha direita já é um símbolo atualizado da campanha Republicana.
 

Acredita que esse atentado pode influenciar a polarização e o clima de violência política nos EUA?

RZ: Dependerá muito de como ambos os candidatos e seus partidos comportar-se-ão a partir de agora. A eleição pôs-se ainda mais incerta. Até agora, Trump e os Republicanos têm um tremendo fato novo a seu favor. Um antídoto para essa novidade pode ser a multicitada possível substituição de Biden por um candidato com vitalidade mais aparente. O cenário de polarização e o clima de violência política nos EUA é observado já a algum tempo. Ninguém, em sã consciência, imaginava uma invasão tão fácil ao Congresso estadunidense após a última eleição. Torcemos para que esse cenário já estabilizado não prospere novamente agora.
 

Quais são as implicações internacionais do atentado contra Trump, especialmente em termos de como outros países veem a estabilidade política dos EUA?

RZ: A estabilidade política dos EUA é fundamental para a estabilidade mundial. Especialmente em uma quadra planetária tão conturbada quanto a atual. O reflexo de uma instabilidade no cenário político estadunidense pode significar catalisar as incertezas que pairam por todo o mundo, tornando-o ainda mais perigoso