O ministro do STF André Mendonça suspendeu em agosto o julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que pode cassar o mandato do governador de Roraima, Antônio Denarium (PP). A decisão ganhou contornos controversos após revelação de que o governo de Denarium pagou R$ 273 mil, em contrato sem licitação, a um instituto fundado pelo próprio ministro: o Iter. O pagamento foi referente a cursos presenciais para funcionários públicos, firmados durante o recurso eleitoral no TSE.
Histórico e impasse no TSE
Denarium, reeleito em 2022, teve o mandato cassado quatro vezes pela Justiça Eleitoral de Roraima, sob acusações de abuso de poder político e econômico em programas sociais usados na campanha. A relatora do processo, ministra Isabel Gallotti, votou pela cassação imediata em 26 de agosto. No mesmo dia, Mendonça pediu vista e suspendeu o julgamento, que segue indefinido mesmo após prorrogação do prazo para devolução do processo.
Contrato sem licitação e valor questionável
O contrato entre o governo de Roraima e o Iter foi firmado em fevereiro, enquanto Denarium recorria ao TSE. Prevê dois cursos presenciais para servidores, incluindo treinamento sobre a nova Lei de Licitações. A Secretaria Estadual de Licitação justificou “inexigibilidade de licitação” para a contratação.
O valor de R$ 273 mil equivale a R$ 45,5 mil por dia, com 40 vagas por turma, para seis dias de duração. O orçamento foi solicitado em dezembro de 2024, e o instituto respondeu em poucas horas com uma extensa proposta, que inclui biografias dos fundadores do Iter. O ministro Mendonça aparece como “founder” e o presidente do instituto é Victor Godoy, ex-ministro da Educação do governo Bolsonaro.
Estrutura e ligações do instituto Iter
Em outubro, o Iter transformou-se em sociedade anônima fechada, omitindo os sócios atuais. Antes, fazia parte Rodrigo Sorrenti, chefe de gabinete de Mendonça no STF, além de outros nomes ligados à burocracia federal e setor educacional. O Tribunal de Contas de Roraima também contratou o instituto para cursos de oratória a conselheiros, desembolsando R$ 54 mil.
Acusações e contexto eleitoral
No processo no TSE, a ministra Isabel Gallotti denunciou uso eleitoral indevido de programas sociais como “Cesta da Família” e “Morar Melhor,” criados durante o ano eleitoral para conquistar votos. Ela apontou aumento de despesas estaduais acima de 42 vezes em 2022, além de simulação de calamidade pública para justificar gastos irregulares. A candidata adversária denunciou também gastos de campanha 25 vezes superiores ao limite legal.
Denarium nega irregularidades, afirma caráter assistencial dos programas e legalidade das transferências.
Análise crítica e implicações
Esse caso expõe graves questões éticas e políticas envolvendo o Judiciário, o governo estadual e instituições ligadas diretamente a um ministro do STF. A suspensão do julgamento por Mendonça, enquanto seu instituto recebe vultosa verba pública, compromete a percepção de imparcialidade e reforça críticas sobre conflitos de interesse.
Além disso, a falta de licitação ao contratar o instituto e os valores elevados por pouco tempo de treinamento indicam práticas questionáveis que precisam ser investigadas com rigor. O impacto no exercício democrático e na confiança pública é imenso, sobretudo em um contexto eleitoral delicado.


