Rio de Janeiro – A dança das cadeiras na Prefeitura do Rio ganhou novo ritmo nesta terça-feira, 27 de maio, com a publicação oficial das exonerações de Joyce Trindade e Luís Ramos, dois nomes estratégicos do governo Eduardo Paes (PSD). Ambos deixam seus cargos no primeiro escalão — respectivamente nas secretarias de Políticas para Mulheres e Cuidado e Proteção e Defesa dos Animais — e retornam à Câmara Municipal, alterando diretamente a composição do Legislativo carioca.
A manobra, que pode parecer apenas uma troca burocrática, ocorre no exato momento em que a Câmara se prepara para votar um projeto bilionário e controverso: a criação de uma Operação Urbana Consorciada (OUC) na região dos antigos Jogos Olímpicos, na Barra da Tijuca e em Jacarepaguá, que entregaria à iniciativa privada, por até 30 anos, a gestão de 1,18 milhão de metros quadrados de território urbano.
Paes usa exonerações como peça no jogo político
As exonerações de Joyce e Ramos não foram casuais. Com seus retornos ao Legislativo, eles reassumem suas cadeiras de vereança — conquistadas com 30.466 e 20.237 votos, respectivamente, nas eleições de 2024. Isso implica o afastamento imediato de dois suplentes que ocupavam temporariamente os postos: Rocal e Flávio Pato.
A substituição afeta diretamente a correlação de forças na votação do projeto de lei complementar da OUC, protocolado há um ano pela própria Prefeitura. O texto já foi debatido em audiência pública e deve agora enfrentar resistência de setores que veem na proposta uma entrega disfarçada de patrimônio urbano ao capital privado.
Mega-OUC na Barra levanta suspeitas de favorecimento
A proposta prevê parcerias público-privadas que envolvem grandes empreiteiras e fundos imobiliários, com foco no reaproveitamento da estrutura olímpica e em novas construções residenciais e comerciais na Zona Oeste. Na prática, a OUC permitiria que empresas privadas comandassem obras, licitações e zoneamentos num dos terrenos mais cobiçados da cidade — sem licitação ampla ou controle social efetivo.
A promessa oficial é de “revitalização”, “mobilidade urbana” e “sustentabilidade”. Mas, na leitura de urbanistas e movimentos populares, trata-se de uma “licença para especular”, como já ocorreu nos arredores do Porto Maravilha — outro exemplo de OUC que ampliou desigualdades, encareceu moradias e expulsou moradores de baixa renda.

O que está por trás da saída de Joyce Trindade?
Aliada de primeira hora de Paes e nome em ascensão no PSD carioca, Joyce Trindade vinha sendo cotada para voos mais altos na política municipal — inclusive como possível vice em uma eventual candidatura de reeleição de Paes em 2026. Sua volta à Câmara levanta hipóteses: estaria ela retornando para garantir o voto governista na OUC? Ou a jogada antecipa uma crise interna no secretariado?
Joyce acumulou elogios à frente da secretaria voltada para mulheres, especialmente por ações de enfrentamento à violência de gênero. Mas sua pasta era também uma das menos estruturadas e menos prestigiadas em termos orçamentários — o que, segundo fontes próximas, gerava atritos com a cúpula do governo.
Câmara vira extensão do gabinete de Paes
Com a movimentação, Eduardo Paes reforça sua maioria na Câmara às vésperas de uma votação-chave, demonstrando que, apesar do discurso técnico e da imagem de “bom gestor”, o prefeito segue operando com a velha cartilha da política carioca: trocas de cadeiras, barganhas de poder e alianças casuísticas.
A tática lembra estratégias recentes vistas em Brasília e em outras capitais, onde prefeitos e governadores desmobilizam resistências e montam bancadas sob medida para aprovar seus projetos mais polêmicos. No caso da OUC da Barra, está em jogo não apenas o futuro urbanístico da cidade, mas bilhões de reais em potencial imobiliário — num modelo que favorece grandes grupos e ignora demandas populares por moradia, saneamento e infraestrutura.
O Carioca esclarece
Quem são Joyce Trindade e Luís Ramos?
Vereadores eleitos pelo PSD em 2024, foram nomeados secretários por Eduardo Paes e agora retornam à Câmara.
Por que a saída deles importa?
Porque muda a composição do Legislativo no dia de votação de um projeto bilionário de interesse do governo.
O que é a OUC da Barra?
Uma operação urbana consorciada que transfere à iniciativa privada o controle sobre área olímpica por até 30 anos.
Como isso afeta a cidade?
Favorece a especulação imobiliária, enfraquece o controle público e amplia desigualdades na Zona Oeste.