Às vésperas de ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) enfrenta um cenário de afastamento entre lideranças evangélicas que o apoiaram no governo e na tentativa de reeleição. Embora o pastor Silas Malafaia continue como principal voz na defesa do ex-mandatário, outros nomes influentes do meio religioso adotam silêncio ou manifestações genéricas sobre liberdade de expressão e religião.
O grupo de WhatsApp chamado “Aliança”, que reúne figuras como Renê Terra Nova, Abner Ferreira e Estevam Hernandes, reflete essa mudança: a maioria das mensagens de apoio parte de Malafaia, enquanto os demais líderes preferem cautela. Um dos pastores chegou a comparar a situação de Bolsonaro à passagem bíblica em que discípulos temem pela sobrevivência do barco em meio à tempestade, sugerindo que parte do grupo já avalia a possibilidade de abandonar o ex-presidente.
A Igreja Universal do Reino de Deus, central na consolidação da presença evangélica na política, mantém silêncio estratégico. Analistas enxergam a postura como pragmática diante da incerteza sobre o futuro político de Bolsonaro. Já o bispo Robson Rodovalho (Sara Nossa Terra) afirmou que “o tempo é o senhor da história”, enquanto o apóstolo César Augusto (Fonte da Vida) alertou para o “clima muito ruim” da guerra ideológica no Brasil e admitiu que a direita tem nomes para 2026 caso Bolsonaro fique inelegível.
A apreensão do passaporte, celular e anotações de Malafaia pela Polícia Federal no mês passado provocou mais repercussão entre pastores do que o próprio julgamento de Bolsonaro. O Conselho Interdenominacional de Ministros Evangélicos do Brasil (Cimeb), fundado por Malafaia, publicou nota de repúdio à sua inclusão nas investigações. O reverendo Augustus Nicodemus Lopes, referência teológica, manifestou solidariedade e criticou o que classificou como “assédio contra um líder religioso”.
Apesar dessas movimentações, o entusiasmo com Bolsonaro já não mobiliza multidões como no auge de sua carreira política. Marchas de apoio atraem menos público, círculos de oração rarearam e pesquisas indicam que, embora a base evangélica ainda seja majoritariamente fiel, está menos disposta a se engajar ativamente em sua defesa.
Para o cientista político Vinicius do Valle, o distanciamento revela cálculo político: “Boa parte da liderança está quieta, aguardando o resultado do julgamento para decidir em que barco permanecer”. Ele também aponta que, enquanto a militância digital segue ativa, o tema ainda não ocupa espaço relevante nas comunidades locais, o que pode mudar conforme o processo avance.