Liberdade

Lula defende comércio sem dólar e rejeita Guerra Fria com os EUA

Em Jacarta, presidente critica protecionismo de Trump e propõe transações Brasil–Indonésia em moedas locais, reforçando a agenda de independência econômica do Sul Global.

Vanessa Neves
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Vanessa Neves
Vanessa Neves é Jornalista, editora e analista de mídias sociais do Diário Carioca. Criadora de conteúdo, editora de imagens e editora de política.
Lula, presidente do Brasil, durante pronunciamento na Indonésia. Foto: reprodução

Durante visita oficial à Indonésia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a defender o uso de moedas nacionais no comércio exterior e criticou o domínio do dólar nas transações internacionais.

Em discurso firme, feito nesta quinta-feira (23) em Jacarta, Lula afirmou que o Brasil e a Indonésia “não querem uma segunda Guerra Fria”, numa resposta direta às políticas protecionistas e ameaças do presidente Donald Trump, que voltou à Casa Branca intensificando barreiras tarifárias contra países emergentes.


Lula mira nova ordem econômica global

O tom do discurso de Lula reflete o reposicionamento do Brasil no cenário internacional. Ao lado do presidente Prabowo Subianto, o petista afirmou que o mundo precisa de uma nova arquitetura econômica “baseada na igualdade e na soberania dos povos”.

“Indonésia e Brasil não querem uma segunda Guerra Fria. Queremos comércio livre. Precisamos de coragem para mudar e deixar de ser dependentes de ninguém”, declarou o presidente brasileiro.

A fala, carregada de simbolismo, ocorre dias antes do encontro entre Lula e Trump, marcado para domingo (26), em Kuala Lumpur, durante a 47ª Cúpula da ASEAN (Associação de Nações do Sudeste Asiático).

Será a primeira reunião presencial entre os dois desde o retorno do republicano à presidência dos Estados Unidos, em meio à pior crise diplomática bilateral em décadas.


Crise tarifária e resposta do Brasil

Desde abril, Washington vem impondo sobretaxas crescentes sobre produtos brasileiros — 10% inicialmente, ampliadas para 40% em julho, sob a justificativa de “emergência nacional”. O governo brasileiro vê a medida como discriminatória e politicamente motivada, já que os EUA assinaram com a Indonésia um acordo de tarifa zero para produtos americanos e redução geral para 19%.

Por outro lado, Trump tem se posicionado contra a chamada desdolarização, criticando países do Brics — grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, que a Indonésia agora busca integrar. O republicano chegou a ameaçar uma tarifa de 100% sobre exportações de nações que substituírem o dólar em suas transações.

Mesmo sob pressão, Lula reafirmou o compromisso com o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) e declarou apoio ao ingresso da Indonésia na instituição financeira do Brics.


Cooperação Sul-Sul e integração econômica

Durante a agenda em Jacarta, Brasil e Indonésia assinaram acordos nas áreas de estatística, agricultura, energia, ciência e tecnologia. Os dois governos também decidiram acelerar as tratativas para concluir um Acordo de Comércio Preferencial entre o Mercosul e a Indonésia até o fim do ano.

Em referência histórica, Lula citou a Conferência de Bandung (1955), evento que lançou as bases do movimento dos países não alinhados durante a Guerra Fria. Segundo ele, “a história da Indonésia é a prova de que é possível construir uma política externa soberana e solidária”.

Além disso, o presidente destacou o potencial conjunto de Brasil e Indonésia para liderar a transição energética:

“Somos países com vastas florestas tropicais, biodiversidade e produção de biocombustíveis. Queremos uma transição justa para economias de baixo carbono”, disse.


Paz e solidariedade internacional

O discurso também incluiu um apelo pela paz na Faixa de Gaza. Ao lado de Subianto, Lula condenou o genocídio e defendeu um cessar-fogo imediato, reiterando apoio à solução de Dois Estados para o Oriente Médio.

“Indonésia e Brasil compartilham o compromisso com a paz, o desenvolvimento sustentável e uma ordem internacional mais justa”, afirmou.

Essa postura consolida o Brasil como voz ativa em defesa do multilateralismo e do diálogo, reforçando a linha diplomática de equilíbrio e autonomia, que também dialoga com as posições do país em fóruns como o G20, a ONU e o Brics.


Significado político e econômico

O novo embate retórico com Trump simboliza uma disputa mais ampla entre dois modelos: o da hegemonia dolarizada e o da cooperação multipolar. Para o governo brasileiro, a diversificação das parcerias econômicas é essencial para reduzir vulnerabilidades externas e retomar o crescimento com soberania.

Entretanto, especialistas alertam que a defesa da desdolarização ainda enfrenta resistências e pode provocar retaliações financeiras. Mesmo assim, o discurso de Lula busca colocar o Brasil no centro do debate sobre a reforma das instituições internacionais e a democratização das finanças globais.

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Vanessa Neves é Jornalista, editora e analista de mídias sociais do Diário Carioca. Criadora de conteúdo, editora de imagens e editora de política.