A importância da História Oral

6 de dezembro de 2025
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© Lucas Menezes/ Gov. RJ
© Lucas Menezes/ Gov. RJ

No segundo artigo que fiz para essa coluna, contei um pouco sobre quando comecei a pensar na minha monografia de final de curso, um dos temas que pensei em desenvolver tinha a ver com a história de Jacarepaguá. 

Isso era bem o início dos anos 2000.

Já havia percebido que pouco ou quase nada tinha sido escrito sobre a região.

Vi ali uma oportunidade ímpar de lançar luz sobre aspectos do passado do meu lugar.

Entendia que um dos temas mais cadentes a ser explorado era aquele referente aos conflitos de terra. 

Bom, mas faltou contar que não cheguei sozinho ao tema, mesmo sendo do lugar em que sempre havia vivido. Muitas pessoas contribuíram, de alguma maneira. 

Uma das minhas primeiras leituras a respeito foi o magnífico estudo escrito pela professora Fania Fridman, “Donos do Rio em Nome do Rei. Uma História Fundiária da Cidade do Rio de Janeiro”. Nele, Fania faz um raio-x minucioso dos principais conflitos fundiários no período colonial. Muita coisa é dita sobre a atual Zona Oeste e Jacarepaguá, em particular. Um dos ensinamentos que com ela aprendi era de que a formação fundiária do Rio (e podemos generalizar para o país inteiro) não foi nada pacífica. O conflito e a violência sempre foram a norma nessa situação.

Importante que se diga, que só cheguei até esse trabalho pela certeira indicação de minha então orientadora na graduação, a professora Márcia Maria Menendes Motta.

E os aprendizados com Márcia foram decisivos na minha sensibilização em relação a essa questão dos conflitos de terra (sem contar que foi com Márcia, que me vi e me entendi pela primeira em minha vida, como Historiador). Foi ouvindo suas aulas, palestras, sua orientação enquanto era seu bolsista de iniciação científica e, fundamentalmente, lendo sua tese de doutorado, “Nas fronteiras do poder”. Nele, a autora fez um detalhado exame das disputas no meio rural brasileiro no século XIX, tendo por base o município de Paraíba do Sul, com base num rigoroso levantamento de processos judiciais, registros de terra e documentos legislativos.

No fundo, foi o estudo desse trabalho incrível e de fôlego da Márcia que fortaleceu em mim o desejo de replicar em outras paragens a investigação desse tema.

E não foi difícil definir o local. Tinha que ser Jacarepaguá. Lugar onde fui formado. Onde as histórias sobre o acesso ao lote por parte daqueles primeiros moradores entre os anos 50 e 60 se faziam presentes, faladas de boca em boca, e que partiam dos mais velhos. Os fatos a respeito de uma briga aqui e acolá, envolvendo moradores contra antigos proprietários, pipocavam de quando em vez.

Conto essa pequena recordação não apenas como ilustração de uma trajetória, e dentro dela, da conformação do território em que vivi como um problema de pesquisa.

Escrevo essas lembranças para fazer ver a importância de nos debruçarmos sobre a história de nosso lugar. E de que para desenvolvê-la, em que pese as inúmeras pesquisas e elaborações acadêmicas que possa haver sobre ele – e elas são sempre essenciais, precisamos nos alimentar das histórias das pessoas que viveram nesse mesmo território. Temos que estar muito atentos e dispostos a escutar as histórias orais que também fazem parte da paisagem do nosso bairro (fazenda, loteamento, morro, vila ou comunidade).

Aprendi com outro professor, Marcos Alvito, num excepcional curso de história oral (também entre 2000 e 2001), que os registros orais também são documentos. Documentos imperfeitos, como todos são, mas que têm a vantagem de serem vivos, atravessados por saberes vários e que são ricos até mesmo pelo que eles tentam não dizer.

Leonardo Soares dos Santos

Leonardo Soares dos Santos

Professor Associado 4 do Departamento de História da Universidade Federal Fluminense/ Campos dos Goytacazes. Também realizei na UFF meu mestrado (2005) e doutorado (2009) em História. Minhas pesquisas versam basicamente sobre as relações entre o espaço rural e urbano e suas implicações em termos de políticas públicas e configuração de grupos sociais. Sou pesquisador do Instituto Histórico-Geográfico da Baixada de Jacarepaguá e editor-chefe da Revista Convergência Crítica.

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