Parlamentares bolsonaristas apresentaram ao presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), uma proposta para preservar o mandato do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) enquanto ele permanece nos Estados Unidos.
A manobra utiliza um precedente aberto durante a gestão do ex-presidente da Casa Eduardo Cunha que isenta líderes partidários do registro de presença no plenário.
A estratégia, articulada por deputados do PL, prevê que Eduardo seja nomeado líder da minoria no exterior, o que lhe permitiria votar remotamente já nesta quarta-feira (17) caso o projeto de anistia aos envolvidos nos ataques de 8 de janeiro avance. O plano expõe mais uma tentativa de flexibilizar regras parlamentares para beneficiar aliados políticos.
Como funcionaria o esquema
O precedente de 2015, criado durante a gestão de Eduardo Cunha, isenta de justificar faltas os integrantes da Mesa Diretora e líderes partidários “em razão da natureza de suas atribuições”. Posteriormente, a isenção foi ampliada para ex-presidentes da Casa e presidentes nacionais de partidos por sugestão do próprio Cunha, e também para Procurador parlamentar, Corregedor e Ouvidor Geral por proposta do deputado Cláudio Cajado (PP-BA).
Atualmente, Eduardo Bolsonaro não exerce cargo de liderança, o que significa que as mais de 70 faltas já registradas não estão cobertas pela regra. A manobra dependeria de uma interpretação extensiva do regimento ou de uma nova resolução da Mesa Diretora que inclua explicitamente “líderes no exterior” entre os beneficiados pela isenção.
Por que a proposta é questionável
A medida representa uma distorção evidente do espírito do regimento interno. O precedente de 2015 foi criado para acomodar ausências pontuais de parlamentares em missão oficial ou por questões de saúde, não para permitir que um deputado exerça mandato permanentemente do exterior.
Especialistas em direito parlamentar alertam que a medida criaria um perigoso precedente para que qualquer parlamentar com recursos suficientes possa morar no exterior enquanto mantém mandato e voto no Congresso, esvaziando o princípio da representatividade e a obrigação de estar presente aos trabalhos legislativos.
Qual o contexto político da manobra
A articulação ocorre no mesmo momento em que Hugo Motta enfrenta pressão para votar a PEC da Blindagem e a anistia aos envolvidos nos ataques golpistas de 8 de janeiro. A nomeação de Eduardo como “líder no exterior” seria uma moeda de troca para garantir seu voto remoto a favor dessas pautas.
A estratégia revela o grau de despertencialização da política brasileira, onde regras são flexibilizadas para atender interesses particulares de grupos políticos. É a mesma lógica que permitiu a Eduardo Cunha criar brechas regimentalares que depois seriam usadas contra ele próprio.
Quais os riscos democráticos
A medida abre caminho para a desterritorialização do mandato parlamentar, rompendo o vínculo essencial entre representante e representado. Um deputado que reside permanentemente no exterior não pode acompanhar as demandas de seu eleitorado, participar de comissões ou exercer adequadamente o mandato.
Além disso, a votação remota permanente contraria o princípio da presencialidade que rege os trabalhos legislativos. Se implementada, a medida criaria duas categorias de parlamentares: os que cumprem suas obrigações no plenário e os que votam à distância, de forma descompromissada com o trabalho legislativo.