Tá Barato

Relator vota para condenar Bolsonaro por racismo

Desembargador classifica falas de Bolsonaro contra apoiador negro como "racismo recreativo" e vota por indenização de R$ 1 milhão.

JR Vital
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JR Vital
JR Vital é jornalista e editor do Diário Carioca. Formado no Rio de Janeiro, pela faculdade de jornalismo Pinheiro Guimarães, atua desde 2007, tendo passado por...
Maicon Sulivan, o “Black Power do Bolsonaro”, ao lado do ex-presidente Jair Bolsonaro. Foto: Reprodução

A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) iniciou nesta terça-feira (16) o julgamento que pode condenar o ex-presidente Jair Bolsonaro por declarações racistas contra um apoiador negro. O desembargador federal relator, Rogério Favreto, votou pela condenação do ex-presidente e da União ao pagamento de R$ 1 milhão cada por danos morais coletivos, classificando as falas como “racismo recreativo”.

O caso refere-se às declarações de Bolsonaro feitas nos arredores do Palácio da Alvorada e em transmissão ao vivo, quando se dirigiu ao apoiador Maicon Suliva – que possui cabelo black power – com frases como “criatório de baratas” e “olha o criador de baratas. Como tá essa criação de baratas?”. O Ministério Público Federal (MPF) pede indenização total de R$ 5 milhões e uma campanha nacional contra o racismo.

Como o relator fundamentou seu voto

O desembargador Rogério Favreto foi contundente em seu voto. Ele argumentou que “a ofensa racial disfarçada de manifestação jocosa, ou de simples brincadeira, que relaciona o cabelo black power a insetos que causam repulsa – no caso aqui, as baratas – atinge a honra e dignidade das pessoas negras”.

A magistratura acompanhou a tese do MPF de que se tratou de violência simbólica praticada por um agente público com representação formal da República. O desembargador Roger Raupp Rios, que também integra a turma, reforçou que “não se podem menosprezar os efeitos de violência simbólica que falas usuais e reiteradas, com intenso conteúdo racialmente ofensivo, têm”.

O que o Ministério Público Federal pede

Além da condenação de Bolsonaro, o MPF requer que a União seja responsabilizada solidariamente por não ter se manifestado contra as declarações à época dos fatos. A procuradora regional Carmem Elisa Hessel defendeu que as falas “reforçam ideias preconceituosas e estigmatizantes sobre os cabelos das pessoas negras, com propósito de desqualificar a identidade e práticas culturais da população negra”.

O MPF solicita:

  • Indenização conjunta de R$ 5 milhões por danos morais coletivos
  • Campanha nacional contra o racismo com duração mínima de um ano
  • Orçamento de pelo menos R$ 10 milhões para a campanha

Qual a defesa de Bolsonaro alegou

A defesa do ex-presidente, representada pela advogada Karina Kufa, argumentou que não houve intenção de ofender. “A manifestação do recorrido nunca poderia ser vista como pretensão de ofensa racial por se cuidar de comentário, ainda que jocoso, relacionado a uma característica específica do seu interlocutor”, disse a defesa.

Este argumento, no entanto, foi rejeitado pelo relator, que considerou que o contexto e a posição de autoridade de Bolsonaro agravam o caráter ofensivo das declarações, independente da suposta intenção.

Por que este caso é emblemático

O julgamento no TRF-4 representa um teste crucial para o combate ao racismo institucional no Brasil. A possível condenação de um ex-presidente por declarações racistas enviaria um potente sinal de que nenhuma autoridade está acima da lei quando se trata de violações de direitos fundamentais.

O caso explicita como o racismo recreativo – disfarçado de humor – perpetua estereótipos e desigualdades raciais. A decisão final poderá estabelecer um importante precedente para o enquadramento jurídico desse tipo de violência simbólica, particularmente quando praticada por figuras públicas.

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JR Vital é jornalista e editor do Diário Carioca. Formado no Rio de Janeiro, pela faculdade de jornalismo Pinheiro Guimarães, atua desde 2007, tendo passado por grandes redações.