Rio de Janeiro – A teocracia infantil deu mais um passo nesta quarta-feira (28), quando o adolescente Miguel Oliveira, de 15 anos, conhecido como “pastor mirim”, foi homenageado com o pomposo título de “Embaixador da Paz no Rio de Janeiro”. O evento aconteceu no auditório da FIURJ (Faculdade Instituto Rio de Janeiro) e foi promovido pela Associação Internacional dos Embaixadores da Paz no Brasil. A cerimônia reuniu religiosos, autoridades e entusiastas da mistura entre púlpito, palanque e precocidade.
Sim, o mesmo garoto que viralizou nas redes com pregações repletas de frases de efeito, doutrinação e desinformação foi celebrado como se fosse o novo Mandela — mas com Bíblia no coldre e discurso alinhado ao bolsonarismo gospel. Apesar de estar proibido de postar conteúdos religiosos nas redes sociais, por ordem do Conselho Tutelar, Miguel segue participando ativamente de cultos e eventos que lhe rendem projeção política.
Evangelismo precoce, discurso ensaiado
Com uma retórica decorada que mistura fundamentalismo religioso, nostalgia militar e antipetismo juvenil, Miguel afirma sonhar em se tornar Presidente da República. “Deus, pátria, família e liberdade” são as palavras de ordem do adolescente que, embora ainda não tenha título de eleitor, já se lança como mascote de uma direita que aposta alto em símbolos e baixo em coerência.
O suposto “líder cristão influente” age como garoto-propaganda da fé como projeto de poder. Sua linguagem imita os jargões da extrema-direita evangélica, com ataques à esquerda, aversão à diversidade e uma cruz ideológica usada como escudo para o autoritarismo.
Conselho Tutelar ignora reincidência
Mesmo proibido de usar redes sociais para evangelizar, Miguel segue participando de eventos públicos — com transmissão ao vivo, microfone aberto e aplausos de adultos que projetam no garoto um messias midiático. É a institucionalização da desobediência institucional.
O Conselho Tutelar, que já havia enquadrado a família por exposição indevida do menor, assiste passivamente à reincidência. Enquanto isso, o garoto sobe em púlpitos, frequenta palanques e acumula títulos simbólicos que seriam cômicos se não revelassem uma estratégia coordenada de naturalização do proselitismo infantil.
Entre o púlpito e o palanque
A consagração do “pastor mirim” como embaixador da paz é uma ironia institucional de gosto duvidoso. A paz que Miguel defende está longe do conceito universal e plural. Ela é aquela que cala opositores, nega a laicidade do Estado e promove a guerra cultural como ferramenta de doutrinação.
O Brasil assiste, complacente, à fabricação de um novo “fenômeno” evangélico — não porque ele tem algo novo a dizer, mas porque repete com eficiência o que os adultos querem ouvir. O culto à autoridade divina como substituto do pensamento crítico é a moeda de troca desse evangelismo de palco.
O Carioca esclarece
Quem é Miguel Oliveira?
Um adolescente de 15 anos que se autointitula pastor, viralizou por vídeos com pregações conservadoras e já foi repreendido pelo Conselho Tutelar.
Por que ele foi premiado como embaixador da paz?
O título foi concedido por uma associação ligada ao meio evangélico, ignorando a polêmica em torno da exposição do menor e de seus discursos divisionistas.
Quais os riscos desse tipo de homenagem?
Naturaliza o uso de crianças como ferramentas políticas e fortalece um discurso autoritário travestido de fé.
Como isso afeta a democracia?
A instrumentalização de menores em nome da religião e da política fere a laicidade do Estado e compromete direitos fundamentais da infância.

