Funk

Justiça mantém prisão de MC Poze do Rodo no Rio

Cantor é acusado de apologia ao crime e associação com o tráfico; atuação em áreas do Comando Vermelho está na mira da polícia

JR Vital
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JR Vital
JR Vital é jornalista e editor do Diário Carioca. Formado no Rio de Janeiro, pela faculdade de jornalismo Pinheiro Guimarães, atua desde 2007, tendo passado por...
MC Poze do Rodo foi preso nesta quinta (29) pela Polícia Civil. Foto: Reprodução

Rio de Janeiro, 29 de maio de 2025 – A Justiça do Estado do Rio de Janeiro decidiu nesta quinta-feira manter a prisão temporária do cantor MC Poze do Rodo, acusado de transformar seu repertório em palanque para o tráfico e de flertar com a linha tênue entre liberdade artística e incitação ao crime. A audiência de custódia foi realizada na famigerada cadeia pública de Benfica, onde o artista permanece detido, para deleite da Polícia Civil e desconfiança de parte da opinião pública.

Apologia ou perseguição judicial?

A detenção, efetuada pela Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE) nas primeiras horas da madrugada, foi cinematográfica – embora sem roteiro de ficção. Poze foi arrancado de sua mansão no Recreio dos Bandeirantes, zona oeste do Rio de Janeiro, descalço, sem camisa e com as mãos algemadas, exibido como troféu em um circo de contenção. A cena viralizou nas redes sociais, dividindo opiniões entre quem denuncia a glorificação da criminalidade no funk e quem enxerga mais uma tentativa do Estado de calar vozes negras da periferia.

Em sua defesa, o cantor — cujo nome de batismo é Romário da Silva — não hesitou em verbalizar a indignação: “Isso é perseguição, mané. Cara de pau, isso aí é perseguição. É indício, mas não tem prova com nada. Manda provar aí.”

Fernando Henrique Cardoso Neves, advogado do artista, diz que tudo não passa de uma “narrativa antiga requentada para criminalizar cultura de favela” e já adiantou que entrará com um pedido de habeas corpus caso o cantor não seja solto nos próximos dias.

Funk no front da guerra urbana

Segundo a DRE, MC Poze do Rodo virou figura frequente em bailes realizados em territórios controlados pelo Comando Vermelho, como a Cidade de Deus, onde criminosos desfilam com fuzis à luz dos holofotes e celulares. A suspeita é de que sua presença nestes locais não é coincidência, mas estratégia: seus shows seriam usados como vitrine da facção, atraindo público, legitimando a presença armada e gerando renda para financiar mais armamentos e drogas.

A Polícia Civil vai além e acusa o conteúdo musical de Poze de ser manual do crime: “Faz clara apologia ao tráfico de drogas e ao uso ilegal de armas de fogo”, diz a corporação. A retórica é de guerra cultural: funkeiros viram alvo preferencial da repressão, enquanto o tráfico segue operando com ou sem trilha sonora.

A tênue linha da liberdade de expressão

A ofensiva contra o artista acende mais um sinal de alerta sobre os limites – e os abusos – da atuação do Estado. A justificativa de que o funk de Poze ultrapassa os “limites constitucionais da liberdade artística” remonta a um Brasil que insiste em censurar o que vem das favelas, mas tolera discursos genocidas em tribunas parlamentares. O contraste é gritante: funkeiro preso por rimar sobre armas, enquanto políticos da extrema-direita seguem impunes por disseminar ódio e desinformação.

Investigações em curso e histórico de repressão

A prisão atual não é caso isolado. Em 19 de maio, após vídeos de criminosos armados circularem durante um baile funk na Cidade de Deus, a Polícia Civil abriu nova investigação. As imagens mostravam fuzis em punho, em clima de normalidade total, como se estivessem em um desfile militar informal.

Poze já havia sido alvo da Operação Rifa Limpa, em novembro de 2024, quando a Polícia Civil o acusou de participar de rifas ilegais online ao lado de sua esposa, Viviane Noronha. Na ocasião, foram apreendidos carros de luxo, joias e cordões de ouro, que viraram símbolos do suposto enriquecimento ilícito do artista. Mas, em abril de 2025, a Justiça devolveu os bens, admitindo que não havia provas suficientes para ligá-los ao crime.

Sobre essa decisão, o cantor disparou nas redes: “Eu só quero o que é meu, e o que Deus generosamente me dá.”

Música criminalizada, sistema seletivo

O caso de MC Poze do Rodo explicita o uso seletivo da Justiça no Rio de Janeiro, onde o funk vira crime e o racismo estrutural é tratado como política pública. A guerra contra o tráfico, transformada em espetáculo midiático, mira sempre o elo mais frágil – o funkeiro, o jovem preto, o artista que incomoda.

Enquanto milicianos disputam poder com o Comando Vermelho a tiros e propina, Poze se torna símbolo de uma repressão que não visa segurança, mas controle cultural. E o Brasil assiste calado – ou dançando, ao som das batidas criminalizadas.

O Carioca esclarece

MC Poze do Rodo foi preso por quê?
Por suposta apologia ao crime, associação com o tráfico e realização de shows em áreas dominadas por facções no Rio de Janeiro.

A Justiça já condenou o cantor?
Não. Ele está em prisão temporária, sem condenação judicial, e a defesa planeja entrar com habeas corpus.

Qual o contexto dos shows nas comunidades?
A Polícia afirma que Poze se apresenta em eventos usados por facções criminosas para lavar dinheiro e ostentar poder armado.

O funk é crime?
Não. Mas frequentemente é alvo de criminalização seletiva por parte das autoridades, especialmente quando associado a artistas de periferia.

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JR Vital é jornalista e editor do Diário Carioca. Formado no Rio de Janeiro, pela faculdade de jornalismo Pinheiro Guimarães, atua desde 2007, tendo passado por grandes redações.