Rio de Janeiro – Doze dias depois de anunciar, com pompa e holofotes, um endurecimento nas regras para motociclistas, o prefeito Eduardo Paes engoliu o orgulho e recuou. Em uma reunião simbólica no Palácio da Cidade, na última terça-feira (27/05), a Prefeitura do Rio anunciou que vai abandonar dois dos pilares mais polêmicos do chamado Plano de Segurança Viária: a limitação da velocidade máxima para motos a 60 km/h e a proibição da circulação desses veículos nas pistas centrais das avenidas Brasil, Presidente Vargas e das Américas.
Na prática, o que se viu foi uma capitulação às pressões de associações de motociclistas, que rotularam o pacote como “carrossel da morte”. Não foi por acaso. Os motociclistas acusam a prefeitura de jogar a categoria no ralo da insegurança, ao forçá-los para as pistas laterais — território dominado por ônibus, caminhões, buracos e barbeiragens. Um convite ao acidente, segundo eles.
Paes recua após pressão organizada
A decisão do recuo foi oficializada por meio de nota divulgada na noite de quarta-feira (28). O texto informa que, após “diálogo com a Federação de Moto Clubes”, a prefeitura decidiu rever os dois pontos. Silêncio total, no entanto, sobre o restante do plano, que inclui faixas exclusivas para motos e parcerias com apps de entrega para punir infratores.
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Quem saiu satisfeito da reunião foi Carlos Maggiolo, presidente da Associação dos Motociclistas do Estado do Rio de Janeiro (AMO-RJ). Para ele, o recuo foi uma vitória incontestável:
“Graças a Deus, caíram essas medidas”, comemorou. E ainda completou: “A prefeitura também desistiu da compra de 150 radares exclusivos para multar motociclistas”.
Argumentos na contramão da lógica técnica
Maggiolo e outros representantes da categoria defendem que motos mais rápidas são mais seguras, pois permitem que os condutores escapem dos “pontos cegos” dos carros. A lógica é simples (mas discutível): andar mais rápido é uma forma de autoproteção.
“Quando você anda mais rápido que o carro, o motorista te vê. Você sai do ponto cego e diminui o risco de ser fechado”, disse Maggiolo, que ostenta 42 anos de habilitação.
A crítica mais feroz, porém, mira a proposta de banir as motos das pistas centrais, vistas como as únicas minimamente seguras no caos urbano carioca. “Nas pistas centrais, o trânsito é menos caótico. Nas laterais, você está ao lado de ônibus, caminhões, buracos. É suicídio institucionalizado”, disparou.
Atores do recuo
Além de Maggiolo, participaram da reunião nomes influentes no setor: o presidente da CET-Rio, Luiz Eduardo Guerra; Gustavo Lorenzo, do Salão Moto Brasil; Danilo Sacramento, do Podcast Trocando o Óleo; Humberto Montenegro, da Federação dos Moto Clubes do RJ; o advogado Armando Souza; e Alfredo Barbosa de Lima, conhecido como Alfredo Cartilha, representante do Sindimoto-Rio.
Cartilha, que elaborou um manual de conduta para reduzir acidentes, não poupou críticas:
“Podem botar 500 pardais que o motociclista vai frear onde sabe que tem radar. Depois acelera. Mas jogar moto para a lateral? Aí é assassinato urbano.”
Interesses por trás da concessão
Não se trata apenas de segurança ou trânsito. Há um cálculo político explícito no gesto de Paes. Com eleições municipais no horizonte e uma base de motoboys cada vez mais articulada — e barulhenta — o prefeito prefere perder para não perder mais.
A crítica central recai sobre a falta de transparência na elaboração do plano e na ausência de dados técnicos públicos que sustentem as medidas propostas. O medo da impopularidade parece ter falado mais alto que qualquer estudo de impacto.
Democracia exige participação — e coerência
Em vez de blindar o debate com dados, a prefeitura preferiu improvisar. Primeiro, anuncia um plano controverso sem diálogo. Depois, cede à pressão e recua silenciosamente. A cidade assiste ao vaivém de uma gestão que prefere remendar ao invés de planejar.
O Carioca esclarece
Quem são os responsáveis pelo recuo nas regras para motociclistas? Prefeito Eduardo Paes, sob pressão da AMO-RJ, Sindimoto-Rio e da Federação dos Moto Clubes do RJ.
Quais medidas foram abandonadas pela Prefeitura? A limitação de velocidade para motos a 60 km/h e a proibição de circulação nas pistas centrais.
Por que motociclistas se opuseram às mudanças? Consideram as pistas laterais mais perigosas, com maior risco de colisões com veículos pesados e buracos.
Como isso afeta o debate democrático sobre mobilidade? Revela uma gestão reativa, sem planejamento público transparente e com baixa participação social.



